São Paulo, domingo, 3 de janeiro de 1999

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ANO 2000
Ano deve ter um clima de preparativos para a festa do ano 2000, embora o século 21 só comece em 2001
1999 será o "sábado' da
virada do milênio

AURELIANO BIANCARELLI

da Reportagem Local

Na "folhinha" dos tempos, o ano que está começando será uma espécie de sábado do novo milênio. As pessoas comprarão roupas novas, irão ao cabeleireiro, arrumarão as estantes, comprarão livros e farão projetos. O ano será de preparativos e planos para a chegada de 2000. Quando o novo ano chegar, o gosto será de um ensolarado domingo. As pessoas festejarão com piqueniques na grama, churrascos na beira da piscina, cervejinha na praia e matinês no shopping. Em abril, o Brasil estará comemorando 500 anos. É motivo para dobrar as festas. Quando 2000 acabar, ainda haverá razões para comemorar o milênio que, de acordo com a história e o calendário, estará começando. Os retardatários ainda terão tempo para um rápido balanço das realizações e uma lista de projetos a serem realizados. Os 800 dias de festa pelo milênio só terminarão na Quarta-Feira de Cinzas de 2001. O fim do Carnaval será a segunda-feira do milênio. Virá então um um período de crises coletivas e depressões individuais.


Expectativas
Os vários cenários da virada do milênio desta reportagem foram construídos a partir de entrevistas, a maioria com psicólogos.
Na opinião geral, o ano que começa será uma uma época de comemorações e de angústias, um tempo de balanços e de projetos, onde tanto os templos religiosos quanto os salões de festas estarão mais cheios.
Os entrevistados ouvidos acreditam que a mudança de milênio deixará as pessoas ansiosas e cheias de expectativas.
"Estar vivo na virada do milênio é uma experiência que poucos vivem, rica e tensa", diz Maria Helena Bromberg, psicoterapeuta e professora da PUC de São Paulo.
Quando as pessoas se derem conta disso, farão planos de urgência, correrão aos shoppings, farão reservas de viagem, consultarão antigas agendas de telefone e procurarão os amigos, acredita Maria Helena.
"Igrejas e templos estarão mais cheios; as pessoas se voltarão mais para a religiosidade", prevê Márua Roseni Pacce, 44, terapeuta, historiadora e professora de ioga. O ano que começa será mais propício para a reflexão, ela afirma.
No seu modo de ver e acreditar, Márua acha que as pessoas tenderão a se organizar e a se juntar em função dessa espiritualidade.
"O milênio está terminando cheio de sofrimento, com mais desemprego e diferenças sociais. O próprio presidente (Fernando Henrique Cardoso) está anunciando um ano de suor e lágrimas, mas as pessoas devem reagir a essa tendência. O vencedor será aquele que se diferenciar diante da crise", acredita Márua, que pretende passar a "virada" para 2000 na Índia.

Comemoração
Para muitos, 1999 será de festas.
"Para mim, será um ano de comemorações", diz a escritora Cristina Porto, que já prepara o aniversário de seus 50 anos em outubro próximo.
Se pudesse, ela manteria os votos de Feliz Natal e bom Ano Novo dependurados na porta, este ano inteiro. "É bom imaginar que estamos mudando de milênio."
Para outros, a carga de transformação de uma virada de mil anos pode terminar em angústias e frustrações, diz a psicóloga Helena Lima, professora da PUC.
"O milênio é um peso muito grande", afirma. "Faz as pessoas se sentirem responsáveis por realizações e metas maiores do que conseguirão cumprir. O balanço pode resultar em sofrimento", acredita a professora.

Depende de cada um
Místicas ou não, terapeutas ou não, as pessoas concordam que as transformações maiores são aquelas que ocorrem do interior para o exterior. "O mundo depende do seu olhar; se você não trabalhar esse olho mágico, nada acontece", diz Jou Eel Jia, médico e acupunturista.
Lidar com o tempo seria outro segredo, mas não há manual que ensine esse mecanismo. "É a nossa mente que atrasa ou adianta o relógio do tempo", diz Jou. "Se a festa está boa, o tempo voa; se estamos deprimidos, o relógio pára."
Sem sincronia com o tempo, as pessoas acabam deixando muita coisa para a última hora. "As consultas aumentam em mais de 30% nas últimas semanas do ano", diz Jou. Por isso, para quem se preocupa com a virada do milênio, um conselho: reserve uma agenda e comece já a prepará-lo.

Céticos
A data tem significados para todas as gerações, para crentes de todos os tipos e até mesmo para os descrentes.
"Desde menino ouço que do ano 2000 não passaremos", diz Luiz Mott, 52, professor de antropologia da Universidade Federal da Bahia.
"O novo milênio representaria a chegada de um outro messias, quando os rios seriam de leite e mel, as espadas se transformariam em arados e o lobo comeria ao lado do cordeiro. Vejo que as pessoas têm esperanças que as coisas melhorem, mas a realidade não aponta nessa direção."
Mott é cético. Ele também não acredita em um aumento da espiritualidade nem em uma suposta energia cósmica que se expandiria com o final do milênio.
"A única energia na qual acredito é a elétrica", diz.



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