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MASSACRE NA BAIXADA
Apelos desesperados marcaram enterro de dois primos que foram mortos em Queimados; adolescente queria entrar para a Marinha
"Quero meu irmão de volta; Vinícius, volta"
TALITA FIGUEIREDO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Eu quero meu irmão de volta.
Volta pra casa Vinícius, volta".
"Chicão, eu vi você vivo. É mentira [que você está morto]. Levanta". Os apelos desesperados marcaram o enterro ontem dos primos Marcos Vinícius Sipriano de
Andrade, 15, e Francisco José da
Silva Neto, 34, no Cemitério da Jaqueira, em Queimados.
Os dois são vítimas de um massacre ocorrido na Baixada Fluminense na noite de quinta-feira
quando 30 pessoas foram assassinadas. Foram mortos na rua Carlos Sampaio, em Queimados, onde outras três pessoas morreram.
Marcos Vinícius, chamado carinhosamente pela família de Pitão,
cursava a 7ª série e tinha o sonho
de entrar para a Marinha e estudar para ser ortopedista. "Meu filho sempre dizia: Mãe, imagina
me ver juntando os ossinhos das
pessoas", contava a mãe, a dona-de-casa Dulce Maria Sipriano, 51.
Marcos Vinícius tinha sete irmãos - mais novas do que ele
apenas as gêmeas de 14 anos. Estudioso, preparava-se para dar
aulas de reforço de matemática,
para os colegas. Seu último dia de
vida não foi atípico. "Ele acordou
às 6h, foi para a escola e voltou para casa às 12h30, como de costume. O almoço já estava pronto.
Ele sempre chegava em casa pedindo logo a comida", diz a mãe.
O jovem passou a tarde estudando para terminar um trabalho
sobre células-tronco que ele entregaria na terça-feira. À noite, depois do jantar, assistiu à televisão
com o pai. "Deitou perto dele e ficou fazendo cafuné no pai. Ele é
muito carinhoso, todo dia falava
"eu te amo, mãe", "eu te amo, pai'".
Antes de dormir, o rapaz lembrou-se de buscar uma cartolina
na casa do sobrinho, que deveria
levar para a escola no dia seguinte.
Saiu de casa, caminhou poucos
metros e encontrou o primo
Francisco, o Chicão. Minutos depois homens passaram atirando.
Atingidos na cabeça e mortos na
hora, foram enterrados lado a lado, na presença de pelo menos
250 amigos e parentes, que levaram cartazes com pedidos de paz
e balões brancos.
Chicão era fiscal de saúde de um
supermercado na Baixada Fluminense. Na quinta, após chegar do
trabalho, ele pedira à mulher Licínia Marcelino Porto Rosa para arrumar o filho deles, Luiz Felipe, de
quatro meses, para ir à casa da irmã Ana Paula, que completava 28
anos naquele dia.
Do lado de fora da casa, ele passara o bebê minutos antes do tiroteio para as mãos da mulher. "Se
não tivesse feito isso, meu sobrinho teria sido morto", disse Ana.
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