São Paulo, terça-feira, 03 de abril de 2007

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Oficiais da reserva condenam negociação

Para eles, falta de punição aos controladores de tráfego aéreo representa quebra de hierarquia e pode abrir precedentes

Ivan Frota diz que Lula pode sofrer processo de crime de responsabilidade caso não reveja decisão sobre a desmilitarização do setor

LEANDRO BEGUOCI
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

JANAINA LAGE
SÉRGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Analistas e oficiais da reserva condenaram a conduta do governo e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de negociar com os amotinados e, principalmente, de não punir os líderes do movimento. Ontem, Lula recuou dessa decisão.
Ouvidos ontem pela Folha, eles apontaram para o risco de a "quebra de hierarquia" espalhar-se para outros setores das Forças Armadas, mas não fizeram paralelo com a crise que antecedeu o golpe militar de 1964. Naquele ano, o então presidente João Goulart evitou que marinheiros rebelados fossem punidos pela Marinha.
"As Forças Armadas, em qualquer lugar do mundo, têm dois dogmas: a hierarquia e a disciplina", afirmou o general Benedito Onofre Bezerra Leonel, 76, ministro-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (pasta antecessora do atual Ministério da Defesa).
"Um pequeno grupo foi contaminado por um sentimento sindicalista, e isso tem de ser expurgado. A atitude do governo foi temerária."
Para o o coronel reformado Geraldo Cavagnari, membro do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp, "todo esse sofrimento foi porque o governo foi frouxo, não soube enfrentar o assunto. Se eu sou favorável a um reajuste salarial? Sou, mas não pode ser desse jeito."
O almirante-de-esquadra Mario Cesar Flores, 76, coordenador do núcleo de Segurança Internacional do Gacint (Grupo de Análise da Conjuntura Internacional), afirmou nunca ter visto algo como o que ocorreu na sexta. "O que eu percebo é que houve uma mutilação da autoridade", disse.
Para Jorge Zaverucha , 51, professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), está havendo um "colapso da autoridade". "Os militares já violaram a hierarquia quando se opuseram ao José Viegas [ex-ministro da Defesa] e agora estão enfrentando o problema da hierarquia e da disciplina internamente."
Nelson Düring, analista do site especializado em assuntos militares Defesa Net, apontou que o "objetivo real" dos controladores era uma melhoria nos vencimentos. "Um grupo de sindicalistas que se criou entre os controladores criou a falsa história da desmilitarização. O governo não percebeu ao engolir esse factóide, quando deveria ter dado um freio."
Na avaliação do brigadeiro Mauro Gandra, ex-ministro da Aeronáutica durante o governo FHC e ex-diretor-geral do DAC (Departamento de Aviação Civil), a manifestação dos controladores na última sexta-feira criou um "fato irreversível" e agora resta esperar pela melhor solução possível.
"Houve insubordinação. E quando a insubordinação é coletiva, é motim", afirmou.
O ex-ministro criticou a atitude dos controladores durante a paralisação. "Foi um aproveitamento covarde, porque o presidente da República estava fora do país", afirmou.

Clube da Aeronáutica
O presidente do Clube da Aeronáutica, tenente-brigadeiro-do-ar, Ivan Frota, condenou a atuação do presidente Lula na negociação com os controladores de vôo. Frota criticou também a postura do ministro da Defesa, Waldir Pires, e disse que ele exerce papel meramente decorativo.
O clube ameaça dar entrada no STF (Supremo Tribunal Federal) com uma ação direta de inconstitucionalidade e denúncia de crime de responsabilidade contra o presidente Lula caso a decisão de desmilitarizar o controle do tráfego aéreo não seja revista. O clube representa a visão dos oficiais da reserva e dos reformados. Tradicionalmente, estes oficiais são zelosos da hierarquia militar.
"O presidente tomou uma atitude precipitada e está sujeito a processo de crime de responsabilidade por não ter punido uma falha combinada, prevista no Código Penal Militar. Em tempo de guerra, a pena para um caso como esse seria a de morte. Normalmente, uma falha como essa é punida com expulsão", disse.


Colaborou a Sucursal de Brasília


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