São Paulo, sábado, 03 de maio de 2008

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Peritos divergem sobre sangue em carro

Um departamento considera que sangue encontrado é de Isabella; outro entende apenas que a probabilidade é grande

Informação sobre o sangue é importante, pois refuta versão da defesa, que alega que o pai a levou incólume para o apartamento

KLEBER TOMAZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Peritos do IC (Instituto de Criminalística) de São Paulo que participaram do caso Isabella divergem sobre o sangue achado na cadeira de bebê, que estava dentro do Ford Ka da família Nardoni, no dia do crime.
A Folha apurou que, enquanto o Centro de Perícias, que elaborou o laudo sobre a cena do crime, trata o sangue como sendo de Isabella, o Ceap (Centro de Exames e Análises de Pesquisas), que fez o laudo sobre o sangue da vítima, entende não ser possível afirmar com certeza que o material encontrado no carro seja da menina. A Polícia Civil e o promotor Francisco Cembranelli assumem como definitiva a posição do Centro de Perícias.
Para a acusação, aliás, o sangue achado no carro, atribuído pela polícia a um corte na testa de Isabella, foi uma das principais provas para indiciar o casal Alexandre Nardoni, 29, pai da criança, e Anna Carolina Jatobá, 24, madrasta, pelo assassinato da menina no dia 29 de março. Isso porque desmontaria a versão da defesa, que diz que o pai a levou dormindo da garagem para o quarto, no sexto andar de seu apartamento, e que ela não tinha ferimentos.
Para a investigação, a madrasta tentou asfixiar a menina e seu pai a atirou por um buraco feito na tela de proteção da janela do prédio na zona norte.
A polícia pediu a prisão preventiva de Nardoni e Anna Jatobá. A defesa do casal, porém, alega inocência -diz que um invasor cometeu o crime. Afirma que o laudo do IC indica que a perícia não provou que o sangue no carro é de Isabella e que vai contratar peritos para dar parecer sobre os laudos.
Dentro do Ceap, a informação é que é grande a chance de o sangue no Ka ser de Isabella, mas o laudo não é conclusivo quanto a isso porque o material coletado estava deteriorado, o que prejudicou o teste de DNA.

Amostra
Na coleta da amostra, os peritos usaram um reagente químico para identificar as manchas (já que alguém tentou limpá-las), o que prejudicou o exame.
Devido a esses problemas, um dos peritos do Ceap disse que, a partir das análises que confrontaram o sangue no carro com o que já havia sido retirado de Isabella, é possível afirmar que há quase 70% de chances de o sangue no Ka ser dela.
Os outros 30%, disse, referem-se à possibilidade de o sangue ser do pai dela ou dos meio-irmãos, já que todos têm "perfil genético" semelhante.
De forma técnica, o perito do Ceap disse que só foi possível identificar de seis a sete lócus (posição de um determinado gene no cromossomo) compatíveis numa das três manchas de sangue colhidas no carro. O ideal, prossegue, seriam 16, para se chegar a 99,9% de certeza.
Segundo a TV Globo, o laudo sobre o sangue diz que a perícia achou na cadeira de bebê uma mistura de materiais biológicos de duas ou mais pessoas -uma delas do sexo masculino. E, por conta disso, não foi possível saber a quem ela pertence.
Mas, para um técnico do Centro de Perícias, o laudo sobre o sangue no carro é conclusivo na medida em que Isabella era a única com ferimento. E que o sangue era "recente".
Uma das atribuições do Centro de Perícias é interpretar a cena do crime a partir de depoimentos e laudos oficiais. Essa interpretação é feita pelo seu Núcleo de Crimes Contra a Pessoa, que também se baseia em laudos do Ceap.
"Os leigos não sabem ler um laudo. O sangue é do mesmo grupo genético da Isabella. Então, se não é da Isabella, é de quem? O pai e os irmãos não tiveram sangramento. Só não vê quem não quer", disse ontem o investigador-chefe do 9º Distrito Policial, Luiz Spinola.
A delegada Renata Pontes, do mesmo distrito, escreveu em seu relatório final sobre o inquérito que o sangue "tem o perfil genético de Isabella".
Procurado pela Folha para comentar as divergências entre os centros, o diretor-interino do IC, Carlos do Valle Fontinhas, diz que "no decorrer das investigações, se tiver dúvidas, elas serão respondidas por eles [peritos]. Não vou me pronunciar. É algo muito técnico".
Consultado pela Folha, Sérgio Mazina, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Ciência Criminal, afirma que "não existe a chamada prova cabal em processo criminal".
Segundo ele, há inúmeros casos em que a confissão, "considerada a rainha das provas, se mostrou falsa". "O que define o julgamento não é a prova, mas um conjunto de provas", diz.


Colaborou EVANDRO SPINELLI, da Reportagem Local


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