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ANÁLISE
Qual o motivo da prioridade dada aos condomínios?
JOSÉ DOS REIS SANTOS FILHO
ESPECIAL PARA A FOLHA
A decisão de criar o Programa de Prevenção e Repressão
aos Roubos a Condomínios no
Estado de São Paulo abriga
uma reflexão cuja abrangência
está longe de ser determinada.
Ainda assim, alguns elementos
podem ser identificados.
Em primeiro lugar, aqueles
que fazem parte de um princípio de realidade. Mesmo que as
situações de violência pareçam
atingir predominantemente
extratos de renda inferiores,
elas permeiam o conjunto da
população. Isso reconhecido,
está em jogo o imaginário que
funda a percepção de cidadelas
inexpugnáveis em meio ao
caos: a vulnerabilidade dos
condomínios fechados é um fato. Apesar dos gastos com a segurança privada, são incapazes
de garantir blindagem.
Em segundo lugar, estão os
elementos que se inscrevem no
campo dos direitos. Tanto
quanto qualquer segmento da
população, os moradores que
optaram por viver em locais
cercados de muros altos têm
também direito à segurança.
O que incomoda, então, no
anúncio de um programa de
prevenção e repressão tal como
o veiculado recentemente? Para começar, a ideia de prioridade a ser dada aos crimes contra
o patrimônio. Que critérios informam tal decisão?
Difícil que sejam quantitativos. Ao longo da década de
2000, conforme projeções feitas a partir de dados da Seade, a
diferença entre os crimes contra a pessoa e os crimes contra
o patrimônio gira em torno de
35%. Não parece ser expressiva
o suficiente para justificar opção tão decisiva.
Mais: no quadro de crimes
contra o patrimônio, observados os roubos cometidos em
condomínios, a Secretaria da
Segurança chega, para este ano,
a um número na casa das três
dezenas. Considerados os crimes contra a pessoa humana,
um crime hediondo, o estupro,
sozinho, oscila na casa dos três
milhares/ano.
À parte dessa opção preferencial na luta contra os crimes
contra o patrimônio, por que
privilegiar os condomínios?
Imaginemos que o critério de
origem foi o da existência de
comunidades territorialmente
concentradas. Por que não programas semelhantes em localidades em que se encontram
grandes conjuntos habitacionais ou populações faveladas?
É provável que ao reconhecer, da forma como o fez, as necessidades dos moradores de
condomínios fechados, a Secretaria da Segurança não tenha
feito outra coisa senão distinguir o poder de pressão desse
segmento da população. Ainda
assim, por que não universalizar esse tipo de serviço, lidando
com a mesma atenção com os
crimes que afetam a pessoa humana e com comunidades que,
sem as facilidades de representação da população dos Jardins,
convivem com situações cotidianas ainda piores?
JOSÉ DOS REIS SANTOS FILHO é coordenador
do Núcleo de Estudos sobre Violência e Políticas
Alternativas da Unesp
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