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Chefe da polícia diz que já é impossível reduzir crimes de oportunidade e aponta "urbanização" como a única saída
Para secretário, repressão está no limite
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma clara demonstração de coragem ou a tábua da salvação.
Ainda não dá para saber exatamente o que as conclusões do estudo feito pelo Uniemp em parceria com a Secretaria da Segurança
Pública vão representar para o governo tucano. Por um lado, a administração pode entrar para a
história como a que ousou buscar
as causas da violência e enfrentá-las. Por outro, talvez fique marcada como aquela que se agarrou a
teses sociológicas para explicar a
invencível criminalidade.
O secretário da Segurança, Saulo de Castro Abreu Filho, 42, diz
que prefere o risco à falta de ousadia. Pré-candidato à Prefeitura de
São Paulo, ele afirma claramente
que a repressão aos crimes de
oportunidade chegou ao limite e
propõe ações integradas entre os
governos municipais para estancar o avanço dos índices. Leia os
principais trechos da entrevista:
Saulo de Castro Abreu Filho -
Qual a importância desta pesquisa? Se eu pudesse pedir a você
uma relevância, seria que cada
um entendesse que tem de fazer o
seu papel. Eu gostaria que o cara
fechasse a Folha e pensasse:
"Realmente não há polícia que
chegue". Um dia eu falei que a polícia chegou ao limite da repressão. P..., levei um pau! Aí eu mandei fazer este estudo. Porque uma
coisa que me deixa muito irritado
são essas políticas públicas nas
quais as pessoas trabalham como
avestruz: fingem que o problema
não existe para, quem sabe, ele
desaparecer. Mas ele só piora. Se
85% dos crimes estão associados
ao desemprego, esquece polícia.
Folha - Por que a cidade é insegura?
Abreu Filho - Porque é uma cidade muito ilegal, com um ambiente
permissivo. É uma cidade desregrada. Há a sensação de que aqui
tudo pode, tudo vale. A coisa da
tolerância zero qual é? Não é dar
pau no bandido, é não deixar começar. Não deixar esculachar.
Folha - Então a solução não existe, porque São Paulo não vai nascer
e crescer de novo.
Abreu Filho - Existe! Tem de regrar. Qual o plano diretor daqui?
Folha - Mas existe em quanto
tempo? O cidadão tem pressa.
Abreu Filho - Ah, mas nós estamos trabalhando com uma geração. A angústia traz a simplicidade da resposta. Aí vem o viés:
"Tem de pôr polícia na rua". E os
governantes vão caindo nessa armadilha. O Jânio [Quadros] criou
uma guarda municipal, e ela só foi
aumentando. E o Benedito Mariano [secretário municipal de Segurança Urbana] disse que vai aumentar para 7.000 homens. Caiu
na armadilha, na tentação da resposta imediata! Vamos encher de
polícia e dar tiro em pobre?
Folha - Então, se polícia na rua é
imediatismo, qual a solução?
Abreu Filho - Precisava de polícia. E colocamos. São 23 mil PMs.
Folha - É suficiente?
Abreu Filho - É, mas vamos ter
mais uns 2.000.
Folha - Mas se a solução está fora
da polícia...
Abreu Filho - A gente está chamando todo mundo -governo
federal e principalmente prefeituras- para trabalhar junto. Não
tem jeito. Tem que chamar o subprefeito, acionar os Consegs
[Conselhos Comunitários de Segurança], atacar no varejo. Mas
você pega a ata de reunião dos
Consegs e vem assim: rua esburacada, falta de iluminação, ponto
distante. Mas eu não ponho ponto! Isso sem falar nas questões estruturais. OK, o dia que o país se
desenvolver.... Mas eu vou ser assaltado até o país se desenvolver?
Folha - É essa a pergunta.
Abreu Filho - Pois é. Da parte da
polícia, qual é o limite? A prisão. E
nós vamos continuar prendendo.
Folha - Ao menos os jovens de hoje vão ver solução?
Abreu Filho - Acho que sim. Mas
a primeira coisa é parar de acreditar que a polícia vai dar jeito nisso.
A polícia vai fazer o quê? Vai lidar
com a sensação de impunidade.
Folha - O desemprego e a desorganização urbana são os maiores
problemas do país?
Abreu Filho - São. Se você pegar a
década de 90, quando esse quadro
foi mais grave, quando desabou.
Folha - Mas a década de 90 foi dominada pelo governo do seu partido. Ele fracassou?
Abreu Filho - Eu acho que foi feito o possível e não se criou uma
esperança de algo que se sabia que
não se iria cumprir. É o que eu estou fazendo aqui, agora. Eu poderia fazer uma coisa demagógica:
"Fique tranqüila, ponho 10 mil
policiais e o bandido vai fugir para Minas". Não vai. Não vamos
resolver com polícia o problema
de dois terços de exclusão social.
Tem de ter saúde, educação...
Folha - Mas o seu partido está no
governo do Estado há dez anos.
Não resolveu por quê?
Abreu Filho - Não resolveu porque as intervenções no município
nunca foram bem coordenadas
entre Estado e prefeitura.
Folha - A repressão foi ao limite?
Abreu Filho - Acho que alguns
[crimes] nós vamos conseguir reduzir ainda mais, os mais organizados, com quadrilha. Outros, esses contra o patrimônio, dificilmente. Posso até dizer que é impossível reduzir esses índices.
Folha - Cite, então, duas ações
que poderiam ajudar.
Abreu Filho - Urbanizar favelas e
cortiços. Esse ambiente introjeta
o conceito de vale-tudo. Vale
montar barraca e vender CD falso. Se não der dinheiro, vale meter
o revólver na sua cara. A primeira
coisa é intolerância. Intolerância
com desmanches, por exemplo.
Tem pai de família morrendo
porque o fulano quer um farol
mais barato. Não vai ter. Manda
trancar tudo. Que se dane. Não dá
para ficar no paliativo: toma chazinho, florais, acupuntura. Tudo
muito simpático, mas tem hora
que não tem jeito: tem de tocar
um antibiótico goela abaixo.
Folha - É para fazer isso que o sr.
quer ser prefeito?
Abreu Filho - Quero que qualquer prefeito faça. Fazer algo que
ninguém tenha tido peito. Política
de segurança tem de ser como política social, não como essa mania
de comprar carro, arma, montar
guarda. Poxa, o Mariano é sociólogo e agora o grande bastião dele
é guardinha andar armado! Não é
razoável que alguém pense assim.
(SÍLVIA CORRÊA)
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