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WALTER CENEVIVA
De águas, florestas e cerrados
É indigno desta geração suprir suas ambições econômicas à custa do sacrifício das próximas
CONSIDERADA PULMÃO do planeta Terra, a floresta amazônica é o trecho mais conhecido de nosso país pelos ambientalistas do mundo, com o acréscimo de
que somos descuidados em preservá-la. Houve até propostas hipócritas de sua internacionalização, antes
e depois do desmatamento extensivo. Panorama diversificado, também ambiental, mas menos visível,
se encontra em outros Estados, servindo de exemplo as ofensas ambientais do Norte-Nordeste.
Não deveria ser assim. Muitos dispositivos da Constituição se voltam
à preservação ecológica, em especial
no artigo 225. Começa dizendo do
direito de todos ao ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de
bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida.
O plano da realidade constitucional não coincide com a realidade física. O poder público e a coletividade
não cumprem seu dever na defesa
de boas condições ambientais. É indigno desta geração suprir suas ambições econômicas à custa do sacrifício das próximas gerações.
Não é só. A variedade dos ataques
ao ecossistema passa por obras que
beneficiam, a curto prazo, milhões
de pessoas, mas sacrificam o futuro.
Imensos lagos artificiais, como o de
Itaipu, subindo o Paraná, além de
nos roubar a catarata das Sete Quedas, alteram o ecossistema regional.
A barragem do rio Madeira parece
outra prova de que o poder público
falha na missão de preservar ou restaurar os processos ecológicos essenciais e o manejo das espécies e
dos ecossistemas.
É de se lamentar que a deficiência
tem inspirado relativamente poucos
processos submetidos ao Judiciário.
Deixando a exuberância da Amazônia, o cerrado centro-nordestino reforça a crítica. Foi objeto de decisão
do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região em face da concessão de todas as licenças ambientais para que
uma multinacional instalasse, no
Piauí, uma indústria para recepção e
processamento de grãos. A desembargadora federal Selene Maria de
Almeida, da 4ª Turma do TRF-1, relatora da ação civil pública impugnando as licenças concedidas, constatou que não foram contemplados
vários pontos relevantes que recomendariam a negativa da licença.
A desembargadora Selene se reportou a dados colhidos em imagens
captadas por satélites, apontando
que 5% do cerrado já foi destruído.
Está no acórdão que o "desmatamento indiscriminado do cerrado
piauiense, sob o argumento de que
as empresas criam empregos", não
merece ser mantido, "pois pode haver atividade economicamente sustentável desde que as empresas estejam dispostas a diminuírem seus
lucros". Para tanto, teriam de se utilizar "de matrizes energéticas que
não signifiquem a política de
terra arrasada".
A decisão, sujeita a recurso, mostra que o enfoque dado na argumentação também se poderia aplicar,
mas não tem sido aplicado, ao desmatamento da floresta amazônica e
a todas as ofensas ecológicas cometidas -até mesmo em usinas elétricas alimentadas por árvores derrubadas sob a desculpa de se criar mais
empregos nas regiões modificadas.
Mesmo que não seja o pulmão do
mundo, é intolerável a destruição da
floresta, sem pensar em sua importância para a saúde dos que nela vivem. As próximas gerações não
nos perdoarão.
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