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Desabrigados por tremor em MG vivem "trauma urbano"
Levadas da zona rural para o centro de Itacarambi, famílias enfrentam desemprego, alcoolismo e violência doméstica
Algumas sonham em voltar para a comunidade rural de Caraíbas, hoje um local fantasma, onde o abalo de 2007 deixou um morto
EDUARDO SCOLESE
ENVIADO ESPECIAL A ITACARAMBI (MG)
As vítimas do abalo sísmico
que no final do ano passado
causou a primeira e única morte no país em decorrência de
um tremor de terra vivem hoje
uma espécie de trauma urbano,
após terem sido deslocadas, por
segurança, para o centro da cidade mineira de Itacarambi (a
663 km de Belo Horizonte).
Há relatos de aumento do alcoolismo e da violência doméstica, além da falta de emprego e
da ociosidade.
Os vastos quintais com hortas, plantações e pequenos animais deram lugar a fileiras de
casas, coladas umas às outras.
Algumas das famílias cogitam arrumar as malas e voltar
para o campo, juntando-se às
três famílias que não acataram
os pedidos da Defesa Civil e
permanecem na comunidade
rural de Caraíbas, atingida pelo
tremor e atualmente um local
quase fantasma.
Em maio, cinco meses após o
terremoto, as 76 famílias afetadas receberam do governo de
Minas uma casa mobiliada no
centro de Itacarambi e foram
orientadas a abandonar seus
pedaços de terra, a 35 km dali.
O tremor de dezembro, de
4,9 graus na escala Richter, matou uma criança de cinco anos e
deixou seis pessoas feridas.
Avelina Bezerra, 46, mudou-se para a zona urbana, enquanto o marido fica na comunidade
atingida pelo tremor. "Lá eu
não consigo dormir. Fico com
medo", afirma a dona-de-casa.
Vera Alice de Oliveira, 26,
mãe de Gesiquelle, 5, que morreu no tremor de dezembro, vive com a filha Taína, 2, numa
das casas construídas pelo governo. "Aqui me sinto mais segura, mas também sinto muito
falta da roça. Estava acostumada a trabalhar na terra", diz.
Itacarambi sofre com o desemprego. As poucas oportunidades surgem nos concursos da
prefeitura, inviáveis para lavradores com baixa escolaridade.
De acordo com a psicóloga
Valéria Patrícia França, o alcoolismo, por causa do desemprego, já é comum nessa região
do Estado, mas tem sido pior
nas famílias atingidas pelo tremor. "As mulheres têm nos
procurado para denunciar abusos dos maridos com bebidas e
com a violência em casa", diz.
A presença de três famílias
na antiga comunidade e a vontade de outras retornarem para
lá preocupam a Defesa Civil.
Jácomo Bezerra, 57, não admite trocar a zona rural pela urbana. Para se proteger, idealizou
uma "arquitetura antiterremoto": construiu um quarto que
tem paredes de madeira e é coberto com telhas finas.
Jácomo, a mulher e a filha de
nove anos ainda circulam pela
casa condenada durante o dia.
À noite, porém, o refúgio é o novo dormitório. "Se cair [com o
tremor], não machuca", afirma.
Em seu pequeno pedaço de
terra, Jácomo cria porcos e galinhas e planta milho, feijão, cana e mandioca. "Como vou viver lá [na cidade]? Ninguém vai
querer dar emprego para um
homem de 57 anos", diz ele.
Cientes do problema, os candidatos a prefeito falam em dar
uma área próxima à zona urbana a essas famílias, para que
possam trabalhar durante o dia
e voltar no final da tarde para as
casas doadas pelo governo.
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