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Campeã do Enem impõe rigor a docente
Melhor colégio estadual da capital paulista no exame a estudantes já mandou para psiquiatra professores que faltaram muito
Diretora do Rui Bloem afirma que faltam recursos para a unidade; apesar de liderar entre estaduais, foi a 335ª na lista geral da cidade
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
"Os nossos alunos mais rebeldes nos chamam de nazistas", conta a diretora da escola
Rui Bloem, Maria Cleuza de
Oliveira Martins, 64. A unidade
obteve a melhor nota no Enem
(Exame Nacional do Ensino
Médio) 2007 entre os colégios
estaduais da capital paulista. A
reclamação dos estudantes, diz
a diretora, decorre do sistema
que a escola adota: disciplina
para alunos e professores.
Segundo a diretora, isso contribui para que a escola, em Mirandópolis (zona sul), seja organizada e tenha um bom ambiente de trabalho. Ambiente
esse complementado pelo aspecto da unidade, com paredes
impecavelmente pintadas e jardins bem aparados.
A conservação, porém, vem
em grande parte dos recursos
dos próprios pais, diz a diretora. Do governo, chegam cerca
de R$ 30 mil para manutenção
ao ano. Só em festas, a APM (associação de pais e mestres) arrecada cerca de R$ 40 mil.
Para a diretora, a falta de investimentos é o pior problema
da escola -mesmo sendo a melhor estadual da capital, no ranking geral da cidade (incluindo
particulares e técnicas) a Rui
Bloem ficou em 335º lugar.
A secretaria da Educação da
gestão José Serra (PSDB-SP)
afirma que aumentou em 80%
a verba de manutenção das escolas entre 2007 e 2008 e que a
Rui Bloem receberá um investimento de R$ 200 mil.
Leia abaixo trechos da entrevista com Maria Cleuza.
FOLHA - O que explica a 1ª colocação da escola entre as estaduais?
MARIA CLEUZA DE OLIVEIRA MARTINS
- Temos uma escola limpa,
organizada, com ajuda dos recursos da APM. Outro ponto
importante é o compromisso.
Tenho professores que são efetivos há muito tempo. Também
tenho pais que cobram muito
dos estudantes e da escola.
O que ajuda muito aqui é a
disciplina. Tem horário para
entrar. O aluno deve trazer o
material certo para cada aula.
Se não o faz, a gente chama o
pai imediatamente. É um trato
"tête-à-tête". Os estudantes
têm "provões" todo semestre.
Tem aluno que vem de escola
particular e fala: "Pô, escola do
Estado desse jeito? Só tirei nota
vermelha". Aqui, são de 42 a 45
alunos por sala. Não dá tempo
para brincadeira. Os nossos
alunos mais rebeldes chamam
a gente de nazista. Mas o que
queremos é disciplina.
FOLHA - Como a escola mantém
professores efetivos, já que os salários são iguais em toda a rede?
MARIA CLEUZA - Acho que o professor sabe que pode contar
com a direção e também há um
ambiente agradável de trabalho. Já o aluno reflete o seu
comportamento, pois sabe que
a equipe gestora é extremamente exigente, vai chamar o
pai se aprontar alguma coisa.
E se a família não cooperar,
encaminhamos para o conselho tutelar. Da mesma maneira
que encaminho professor para
psiquiatria. Hoje existe a falta
médica [sem desconto do salário], desde que seja em dias alternados. Assim, o professor
pode trabalhar terça e quinta.
Segunda, quarta e sexta ele pode arrumar um atestado, às vezes até compra, e tem o dia abonado. Aqui, se começar com atestado, eu dou uma guia e peço uma avaliação médica. Já fiz
isso com quatro professores.
FOLHA - Os salários são baixos?
MARIA CLEUZA - Ganho cerca de
R$ 1.200 como diretora. Como
professora aposentada, mais
R$ 1.000. É pouco.
FOLHA - Quais são as grandes dificuldades da escola?
MARIA CLEUZA - Financeira.
Com uma escola deste tamanho, só agora ganhamos um datashow. Um para três mil alunos. Segunda-feira [amanhã] começa o curso técnico de administração de empresas [novo
projeto do governo, oferecido a
parte dos alunos do ensino médio], e não estamos preparados.
O que foi dito é que esse curso seria 50% online e 50% presencial. O curso começa com
giz, apagador e saliva.
FOLHA - E sala de informática?
MARIA CLEUZA - Os computadores são muito ultrapassados.
Quando o governador veio aqui
[em fevereiro, Serra foi à escola
lançar um programa de transferência de verbas às escolas],
foi feita a parte elétrica. Ficaram de mandar computadores
condizentes. Dez computadores para 40 alunos não dá. E
nossos computadores são "tartaruga futebol clube", de 95, 98.
FOLHA - O governo anunciou diversas medidas para 2008, como implementação de um currículo, recuperação para todos os alunos nos primeiros 40 dias entre outras. As escolas conseguem absorver tudo isso?
MARIA CLEUZA - Acho que não.
Deveria consultar as bases antes de implementar. Senão dá
impressão de imposição e, assim, não há garantia que o professor vá implementar o projeto na sala de aula.
Nada deveria ser imposto e
ainda mais com pouco tempo
de preparação. O jornal, por
exemplo [refere-se à recuperação inédita implementada pelo
governo, cujos conteúdos foram apresentados por meio de
jornais], chegou na véspera do
planejamento [pedagógico].
Esse material trouxe algumas reclamações. Professores
entenderam como engessamento dos seus trabalhos. Discordo. O que acabou foi a soberania. O professor usa sua didática, mas ele trabalha num sistema, com regras que precisam
ser seguidas. A rede estadual é
muito grande e precisa de parâmetros. Cada um fazia o que
queria, planejava o que queria.
Para a gente não trouxe muita novidade, porque já trabalhávamos com um currículo,
que se assemelha em muito ao
que a secretaria estabeleceu.
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