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GILBERTO DIMENSTEIN
A escola da rua
Ao visitar o Brasil semana
passada, o sociólogo do trabalho Domenico De Masi previu a
desvalorização do diploma de
ensino superior -um papel reverenciado, cobiçado pelo dom
de assegurar bons salários.
No momento de contratar, as
empresas tenderiam, segundo
ele, a olhar menos para a galeria de diplomas, e mais para o
acúmulo de experiência.
Estamos assistindo ao fim da
escola? Muito provavelmente.
A escola como a conhecemos
está com os dias contados.
Quem está no mercado de
trabalho, acompanhando a
evolução das empresas, e, ao
mesmo tempo, na escola percebe um monumental abismo.
A escola simplesmente não
consegue acompanhar a rapidez das transformações, presa
a conteúdos ultrapassados;
professores sem referenciais na
realidade ministram testes
inúteis, imprestáveis fora da
sala de aula, pelos quais os alunos são indevidamente avaliados.
O que as empresas querem é o
óbvio: alguém que resolva problema, que supere os conflitos,
usando a improvisação, criatividade, intuição.
Como na era da informação,
movida a globalização, os problemas se renovam com crescente velocidade, o indivíduo
deve estar apto a se reciclar
sempre.
Por esses motivos, as grandes
empresas do tipo Xerox, IBM,
Microsoft e Packard lançam as
próprias universidades.
Daí a aposta de Domenico na
perda de valor do diploma.
Canudos de Harvard, Columbia, USP, FGV ou Unicamp obviamente ajudam.
Mas esse diferencial tende a
se enfraquecer caso, em primeiro lugar, o aluno não se mantenha atualizado, com novos
cursos -e, em segundo, não for
nutrido com um acervo de experiências.
Qual seria, então, a boa escola? É a escola da rua.
É aquela que obriga o estudante, desde o início de sua vida escolar, a resolver problemas, simulando a realidade; a
partir daí, são encaixadas as
cadeiras como português, história, química, física, matemática.
A informação é apresentada
dentro de um contexto, nada a
ver com aquela decoreba, esquecida no dia seguinte ao da
prova.
A boa escola é aquela em que
os professores, transformados
em tutores, administram cotidianamente a "rua".
São habilitados a separar o
efêmero do essencial; teriam
tarefa semelhante ao do colunista de jornal, aquele que vê a
balbúrdia e, no mesmo dia, é
obrigado a detectar o que é importante.
Trazer a rua significa também levar o estudante para a
rua -e, aqui, a Internet assume toda a sua potencialidade.
Ir para a rua é mais do que visitar museus, teatros, fazer excursões.
É também oferecer ao aluno
experiências práticas, inundando-o de realidade, convidando-o cedo a lidar com conflitos. Do conflito, o professor
extrai as lições dos livros.
Quero dizer: trabalhos comunitários devem valer nota. Assim como estágios em empresas.
Não me refiro, aqui, a estágios ou visita a favela esporádicos. Mas a uma rotina de vivência fora dos muros escolares.
Um passo relevante é dado
em nosso país -é das boas notícias que temos.
As melhores universidades
brasileiras começam a usar como critério no vestibular o
Enem (Exame de Ensino Médio). Esse teste não mede informação acumulada, mas manejo de associações de dados. Induz à reflexão, não à memorização.
A educação do futuro, portanto, está na rua.
PS - Nestes últimos dez anos,
tenho acompanhado e me envolvido em experiências de
educação, centradas no conceito de "escola da rua"; são fatos,
lições e personagens que vou
coletando pelos lugares em que
morei ou visitei, de Nova Déli a
Salvador, passando por Nova
York e São Paulo.
Venho produzindo um diário
de bordo, textos que vou escrevendo e reescrevendo, com ajuda de amigos-tutores.
Abro, hoje, esse inconcluso
diário de bordo aos leitores, colocando-o no Universo Online
no site www.aprendiz.com.br.
Graças à Internet, já podemos
fazer livros interativos, com autoria coletiva.
E-mail: gdimen@uol.com.br
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