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CENSO 2000
Pesquisadora diz que invasões de terra não são exclusividade de pobres e exemplifica citando a Barra da Tijuca, no RJ
Para geógrafa, favelização é fato consumado
DA SUCURSAL DO RIO
Especialista em geografia urbana e autora do texto sobre a questão urbana no Atlas Nacional do
Brasil (IBGE), Fany Davidovich
considera favela "um fato consumado nas grandes metrópoles",
agravado pela influência da TV.
Folha - Embora São Paulo tenha
mais favelas, o Rio ainda é mais associado a elas. Por quê?
Fany Davidovich - É um direito
de antiguidade. A favela é mais
antiga na paisagem urbana do
Rio. E faz parte da poesia, da literatura, da música da cidade de
uma forma idealizada, romântica.
Em São Paulo, ela é mais recente e
sempre ficou muito longe da cidade central. O Rio é uma cidade
mais democrática. Há melhor
exemplo do que a casa do Roberto
Marinho (no Cosme Velho, zona
sul), que é o entorno da favela?
Folha - O que explica esse processo de favelização no país?
Fany - É difícil dar uma resposta
generalizante. Mas há alguns pontos convergentes desse processo.
O abandono do campo e a falta de
cidades de porte intermediário. A
modernização do campo expulsou a mão-de-obra. Só que, antigamente, ia tudo para RJ e SP,
agora eles vão a outras cidades.
Folha - Para muitos, favela é sinônimo de problema...
Fany - A favela é parte da produção da cidade brasileira. Se você
tem uma produção de uma cidade que tem elites, classe média,
classes operárias e tudo o mais, a
favela é parte disso. Ela é uma expressão da sociedade brasileira.
Folha - No passado, para muitos a
saída era a remoção. Hoje, parece
ser a urbanização.
Fany - Tem que urbanizar. Há
condições terríveis de existência
dentro de favelas. Mas o que
adianta fazer uma bela urbanização na favela e ter gente lá que não
vai poder arcar com impostos?
Urbanização significa tributos.
Folha - E o nascimento de novas
favelas deve ser tolerado?
Fany - Como impedir uma população de sobreviver se essa é a
forma de sobrevivência? Todos
têm direito à cidade. Favela é um
fato consumado nas grande metrópoles. A saída seria oferecer
uma alternativa digna. Como não
se apresentam alternativas, os governos têm fechado os olhos.
Houve um tempo em SP no qual o
governo dava passagem para migrantes e os mandavam para
Campo Grande. São atitudes fascistas, mas eram alternativas.
Folha - Há favelas que estão se
expandido, desmatando. A Rocinha, na zona sul do Rio, por exemplo, está crescendo em cima de encostas e da mata.
Fany - É preciso lembrar que há
condomínios de classe média alta
que se apropriaram de encostas e
vivem na ilegalidade. As invasões
não são só de gente pobre. Inúmeras cidades brasileiras foram
construídas na base da invasão. A
Barra da Tijuca (zona sul do Rio)
é um excelente exemplo.
Folha - Quais são os detonadores
do processo de favelização?
Fany - A TV é um agente incrível
de mobilização da população pelos serviços e bens urbanos. Há
essa vontade de viver uma vida
que é divulgada pelos meios de
comunicação como tendo oportunidades melhores de sobrevivência. É interessante perguntar a
um morador de favela se ele quer
voltar a seu lugar de origem. É difícil ouvir uma resposta positiva.
Por pior que sejam as condições, a
cidade oferece um sonho.
(LUIZ ANTÔNIO RYFF)
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