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Dor é consenso, mas prejuízo gerado pelas LER/Dort continua indefinido
DA REPORTAGEM LOCAL
Todos concordam que suas manifestações são dolorosas e que muitas das suas vítimas
precisam se afastar
do trabalho. Mas não há consenso
quando se tenta classificá-la como
uma doença ou síndrome nem
quando se quer quantificar as
perdas que provoca para o país.
Talvez por isso mesmo o "mal"
precise ser identificado por uma
combinação de duas siglas, LER/
Dort -lesões por esforço repetitivo e distúrbios osteomusculares
relacionados ao trabalho. Para
muitas de suas vítimas, o diagnóstico de LER/Dort pode significar o
final de uma vida profissional e a
sensação de incapacidade.
A síndrome afeta principalmente pessoas que fazem esforços repetitivos, como os digitadores e
bancários, por exemplo. Mas aparece também naqueles que desempenham outras tarefas, mas
estão sob constante estresse no
trabalho ou em períodos de grande turbulência emocional.
Maria José O'Neill, presidente
do Instituto Nacional de Prevenção às LER/Dort, diz que um
quarto dos trabalhadores do Banco do Brasil padece desse mal. Segundo ela, especialistas estimam
que, entre doenças e acidentes de
trabalho, os empresários perdem
R$ 20 bilhões, e o governo, R$ 12
bilhões ao ano, a maior parte por
conta das LER/Dort. Ela cita uma
pesquisa Datafolha/Ministério da
Saúde que encontrou 310 mil trabalhadores com LER/Dort em
São Paulo, ocupando o segundo
posto entre os afastamentos.
O'Neill participou do debate
promovido pela Folha na segunda-feira sobre como tratar e prevenir essa doença. O reumatologista José Knoplich -também
participante- contra-atacou
com a pesquisa de uma revista nacional onde a primeira queixa dos
entrevistados era a cefaléia, seguida de lombalgia. "A LER/Dort
nem foi citada", disse Knoplich.
"Não haverá entendimento enquanto o social e a qualidade de
vida do trabalhador estiverem de
um lado e a economia financeira
de outro", diz a médica Maria
Maedo, coordenadora do Cerest
(Centro de Referência para a Saúde do Trabalhador do Estado).
O debate terminou com uma
conclusão: os pacientes de fato
são discriminados e convivem
com dor intensa. Falta saber a origem dessa dor, a melhor forma de
preveni-la e como tratá-la.
Para Knoplich, não são apenas
os movimentos repetitivos que
provocam a doença, mas uma série de fatores. "Se afastarem esse
trabalhador, ele não deixará de
sentir dor", diz. "Ficará pior, porque se sentirá incapaz e discriminado. É preciso saber quais as razões psicossociais que estão provocando a dor, por isso o tratamento deve ser multidisciplinar.
Para muitos pacientes, um antidepressivo será a solução."
Knoplich classifica os números
citados como um "absurdo epidemiológico". "Um atestado de
LER/Dort garante a aposentadoria e até a quitação da casa própria. Nem doentes de câncer tem
todos esses privilégios."
Maedo, que tem contato direto
com trabalhadores e médicos do
trabalho, diz que as LER/Dort não
vêm sendo tratadas com a seriedade necessária. "A cidadania
ainda não chegou à maioria das
fábricas e locais de trabalho", diz.
Para ela, o que conta é a pressão
por maior produção, menores intervalos e cobrança mais rigorosa.
"Diante da crise, o trabalhador
tem medo de dizer que está doente. Segundo a Organização Mundial do Trabalho, apenas um
quarto das doenças ocupacionais
é revelada pelo trabalhador."
Daniel Feldman, professor de
reumatologia na Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp),
diz que a LER não existe como
doença. "É um termo que abarca
uma série de lesões causadas por
movimentos repetitivos. Todas
essas lesões podem ser pioradas
pelo ambiente de trabalho, mas
LER não é uma doença. Há médicos que entram nesse engodo. Para mim, o fato é que o paciente
tem dor e precisa ser tratado, pouco importa se a dor foi provocada
na fábrica ou em casa."
José Erivalder Guimarães, médico do trabalho e presidente do
Sindicato dos Médicos de São
Paulo, afirma, ao contrário de
Knoplich, que há "um exagero de
subnotificação, não um exagero
epidemiológico" no país.
A resposta, segundo Erivalder,
são investimentos no estudo e na
prevenção dessa síndrome. Ele cita uma metalúrgica do ABC onde
os doentes de LER/Dort são separados dos trabalhadores sadios.
"É uma humilhação que não pode
continuar. Achar que um trabalhador está simulando uma LER/
Dort é um absurdo inconcebível."
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