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Indústrias tentam desacreditar o país, afirma consultor
Para Brook Baker, da Universidade de Northeastern (EUA), menção à junta militar da Tailândia indica essa estratégia
Professor diz que suposta ameaça à pesquisa e críticas aos genéricos são parte de um conhecido discurso contra a quebra de patentes
FABIANE LEITE
DA REVISTA DA FOLHA
Vincular a decisão de quebrar patentes de remédios a regimes autoritários faz parte das
conhecidas estratégias da indústria farmacêutica contra a
medida que ameaça seus lucros. Essa é a opinião de Brook
Baker, professor de direito da
Universidade de Northeastern,
em Boston, e conhecido defensor do licenciamento compulsório de remédios.
Segundo ele, foi esse um dos
meios de taxar de ilegítima a
decisão tailandesa de licenciar
compulsoriamente três produtos. Agora, é utilizado contra o
Brasil. Mas o fato é que, nos
dois países, a luta de entidades
de direitos humanos para garantir acesso a medicamentos
ajudou a convencer civis e militares de que valia pena, conclui.
Consultor da ONU no projeto que fixou as metas do milênio e da ONG norte-americana
Health Gap, que luta pelo acesso a medicamentos essenciais,
Baker elogiou a opção brasileira. "A dinâmica de preços com a
competição dos genéricos tem
sido sempre melhor a longo
prazo do que negociar valores."
Leia outros trechos da entrevista concedida via e-mail.
FOLHA - A Câmara Comercial Americana comparou o Brasil à junta militar que governa a Tailândia, em razão do licenciamento compulsório
do Efavirenz.
BROOK BAKER - Uma das maneiras que o governo norte-americano, a Câmara de Comércio e
as grandes indústrias farmacêuticas usaram para desacreditar os licenciamentos compulsórios na Tailândia foi apontar para o fato de a autorização ter vindo de um governo
militar. No entanto, movimentos sociais na Tailândia têm
pressionado por isso desde
1999 e o governo democrático
da Tailândia também trabalhou com esse objetivo durante
três anos. Da mesma maneira,
movimentos sociais no Brasil
tiveram um importante papel
no convencimento do governo
de que a sustentabilidade do
programa de Aids é dependente da disponibilidade de terapias. Acredito que as forças comerciais dos EUA não conseguirão classificar a decisão brasileira como ilegítima, mas tentarão desacreditar o Brasil por
priorizar a saúde dos cidadãos
no lugar do monopólio das
grandes farmacêuticas.
FOLHA - Outro argumento é o de
que o licenciamento poderá afastar
investimentos em pesquisa e desenvolvimento.
BAKER - As indústrias de medicamentos estão focando a
América Latina e a Ásia, especialmente países de renda média que possam explorar com
preços altos. Mesmo assim, os
mercados de países em desenvolvimento representam apenas 11% das vendas globais dessa indústria. Até agora, no entanto, jamais investiram em
pesquisa e desenvolvimento no
Brasil para o desenvolvimento
de drogas somente. Da mesma
forma, mesmo quando eles instalam suas fábricas, o que raramente ocorre em países em desenvolvimento, é apenas para
ter vantagens com os custos
menores de produção.
FOLHA - A qualidade dos remédios
genéricos é ruim, como diz a indústria de medicamentos?
BAKER - A indústria farmacêutica sempre busca diminuir a
qualidade dos genéricos. No
entanto, a qualidade das versões indianas do Efavirenz foi
confirmada pela Organização
Mundial da Saúde durante seu
projeto de pré-qualificação,
que inclusive confirmou a bioequivalência e as boas práticas
de fabricação de pelo menos
três produtores. A questão da
qualidade é uma cortina de fumaça que a indústria utiliza para tentar justificar seus preços.
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