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São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2003

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Especialistas criticam modelo repressivo

DA REPORTAGEM LOCAL

Ninguém duvida que a "educação pela punição" funciona no trânsito, mas muitos condenam esse modelo. "Normas são necessárias, mas não se pode basear uma política de prevenção em cima de uma política repressiva", diz o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Segundo ele, esse conceito é condenado mesmo por especialistas norte-americanos e rejeitado no Canadá e na maioria dos países europeus. "Normas impostas não são instrumentos de prevenção e mudança de comportamento", diz Silveira.
"Caso contrário, corre-se o risco de transformar a norma numa ingerência na vida privada das pessoas. Aí vem o aprisionamento, acaba a individualidade e a democracia. O Estado hoje determina onde e a qual hora você pode beber, amanhã determinará o que você pode comer e, em seguida, quando você poderá fazer sexo."
Segundo Silveira, tais práticas florescem nos EUA por ser lá o país "da guerra contra as drogas". "Florescem lá e em países muçulmanos, onde prevalecem ideologias maniqueístas, de fundamento religioso, onde existe o mocinho e o bandido."

Agindo pelo medo
A psicoterapeuta Helena Lima, professora do Centro de Educação da PUC, vê nesse modelo "mais repressão que educação". "É um adestramento no qual as pessoas agem por medo, não preocupadas com elas mesmas ou com os outros", afirma.
"Se punição resolvesse, o sistema penitenciário não seria o fracasso que é." Ela cita o caso dos radares, que reduziram a velocidade nas vias. "As pessoas estão sendo educadas? Não, estão só fugindo das multas."
A idéia de antes ouvir a comunidade, para trabalhar em sintonia com ela, como se pretende em Paulínia, também seria um recurso com viés deformado. "Você conduz as pessoas de tal forma que elas passem a achar que estão fazendo o que de fato gostariam de fazer", diz Lima.
Mesmo o projeto da "lei seca", do fechamento dos bares em determinados horários, é visto como uma "estratégia para modelar o comportamento que as pessoas devem ter", diz Xavier da Silveira. "O que pode parecer um respeito é um desrespeito à comunidade."
O psiquiatra diz que medidas como o fechamento de bares "só são justificáveis em situação de crise". "É aceitável numa situação de exceção, mas não como princípio de tratamento. Isso é incompatível com a liberdade."
Silveira, no entanto, concorda com os estudos que demonstram uma queda da violência quando os bares estão fechados.
Aliás, entre as políticas pregadas pela Organização Mundial da Saúde estão o aumento do preço das bebidas, a proibição da propaganda e mesmo a redução no número de bares.
(AB E CC)


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