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"Não tenho que estar presa"
DA REPORTAGEM LOCAL
No 89º Distrito Policial, no Morumbi (zona oeste de São Paulo),
Bernadete Pacheco divide uma
cela com três presas. Dorme em
um colchonete e quase não come.
"Não assumo a condição de estar
num cárcere, pois sou inocente",
ela diz. "Só me alimento o suficiente para me manter em pé."
A assistente social está há 11
anos na Santa Casa, se formou em
1990 nas Faculdades Metropolitanas Unidas e fez pós-graduação
em comunicação social pela Cásper Líbero. Esteve no Instituto da
Criança do Hospital das Clínicas
antes de ir para a Santa Casa.
Leia abaixo trechos da entrevista que ela concedeu à Folha:
Folha - Como foi a primeira noite
que passou na cadeia?
Bernadete Pires Pacheco - Mesmo no dia em que minha mãe
morreu, eu nunca vi tanta tristeza
nos olhos do meu pai, quando
disseram que eu estava sendo presa. Me deixaram numa cela improvisada no 77º DP, com as duas
mulheres que me acusavam. Não
havia luz nem ventilação e havia
urina pelo chão.
Folha - E como foi a reconstituição do crime na Santa Casa?
Pacheco - Foi a cena mais humilhante da minha vida, eu, algemada, diante das televisões e de todo
mundo que trabalha na Santa Casa. Eu dizia ao delegado que nem
tinha estado no hospital no dia do
crime, mas ele pedia para eu fazer
o que a Marta dizia que eu tinha
feito. Para me levar, foram três ou
quatro carros da polícia, como
seu fosse uma criminosa perigosa.
Não tinha ninguém para me
orientar (segundo o advogado dela, o delegado o proibiu de acompanhar a reconstituição e o impediu de ver o inquérito antes).
Folha - Você tem tido contato
com a família?
Pacheco - Fiquei dez dias incomunicável. A primeira visita foi
na quinta da semana passada.
Além do pai, eu tenho um irmão e
uma irmã. Eles estavam muito
abatidos, inconformados. Tenho
recebido muitos bilhetes de colegas. Da Santa Casa chegaram
mais de 50. Ganhei até uma Bíblia,
porque no cárcere todos têm
uma, você se apega em Deus, precisa orar. É assim que tenho passado meus dias na cadeia.
Folha - Depois que sair, você pensa em fazer o quê?
Pacheco - Gostaria de voltar ao
trabalho imediatamente. Depois,
quero ser indenizada, pois foram
danos morais violentos. Nada paga a humilhação de descer de um
camburão, algemada, no local onde você trabalhou por 11 anos. Tenho um endereço, uma família,
muitos amigos e um trabalho ao
qual me dedico. Não tenho que
estar presa, como se fosse uma
ameaça às pessoas.
(AB)
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