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São Paulo, sexta-feira, 07 de novembro de 2003

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"Não tenho que estar presa"

DA REPORTAGEM LOCAL

No 89º Distrito Policial, no Morumbi (zona oeste de São Paulo), Bernadete Pacheco divide uma cela com três presas. Dorme em um colchonete e quase não come. "Não assumo a condição de estar num cárcere, pois sou inocente", ela diz. "Só me alimento o suficiente para me manter em pé."
A assistente social está há 11 anos na Santa Casa, se formou em 1990 nas Faculdades Metropolitanas Unidas e fez pós-graduação em comunicação social pela Cásper Líbero. Esteve no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas antes de ir para a Santa Casa.
Leia abaixo trechos da entrevista que ela concedeu à Folha:

Folha - Como foi a primeira noite que passou na cadeia?
Bernadete Pires Pacheco
- Mesmo no dia em que minha mãe morreu, eu nunca vi tanta tristeza nos olhos do meu pai, quando disseram que eu estava sendo presa. Me deixaram numa cela improvisada no 77º DP, com as duas mulheres que me acusavam. Não havia luz nem ventilação e havia urina pelo chão.

Folha - E como foi a reconstituição do crime na Santa Casa?
Pacheco
- Foi a cena mais humilhante da minha vida, eu, algemada, diante das televisões e de todo mundo que trabalha na Santa Casa. Eu dizia ao delegado que nem tinha estado no hospital no dia do crime, mas ele pedia para eu fazer o que a Marta dizia que eu tinha feito. Para me levar, foram três ou quatro carros da polícia, como seu fosse uma criminosa perigosa. Não tinha ninguém para me orientar (segundo o advogado dela, o delegado o proibiu de acompanhar a reconstituição e o impediu de ver o inquérito antes).

Folha - Você tem tido contato com a família?
Pacheco
- Fiquei dez dias incomunicável. A primeira visita foi na quinta da semana passada. Além do pai, eu tenho um irmão e uma irmã. Eles estavam muito abatidos, inconformados. Tenho recebido muitos bilhetes de colegas. Da Santa Casa chegaram mais de 50. Ganhei até uma Bíblia, porque no cárcere todos têm uma, você se apega em Deus, precisa orar. É assim que tenho passado meus dias na cadeia.

Folha - Depois que sair, você pensa em fazer o quê?
Pacheco
- Gostaria de voltar ao trabalho imediatamente. Depois, quero ser indenizada, pois foram danos morais violentos. Nada paga a humilhação de descer de um camburão, algemada, no local onde você trabalhou por 11 anos. Tenho um endereço, uma família, muitos amigos e um trabalho ao qual me dedico. Não tenho que estar presa, como se fosse uma ameaça às pessoas. (AB)


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