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São Paulo, domingo, 09 de fevereiro de 2003

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CAMINHO DA FÉ

Rota referendada pela Igreja Católica como versão brasileira do Caminho de Santiago terá inauguração oficial na 3ª

Nova trilha atrai pagador de promessa

MAÉRCIO SANTAMARINA
ENVIADO ESPECIAL AO CAMINHO DA FÉ

A fuga de um pônei levou Netinho, 10, a andar quase 200 quilômetros a pé, durante uma semana, na esperança de reencontrar o animal. Com a caminhada, o garoto antecipou o pagamento de uma promessa a Nossa Senhora Aparecida, sua santa de devoção.
O pequeno peregrino Antonio Bilarva Neto se transformou, dessa forma, num dos desbravadores do Caminho da Fé -a versão brasileira do Caminho de Santiago de Compostela apoiada pela Igreja Católica-, que será inaugurado oficialmente na próxima terça-feira, numa solenidade em Águas da Prata (estância turística a 235 km ao norte de São Paulo).
Na volta da peregrinação, que acabou virando uma divertida aventura para Netinho em seus últimos dias de férias, Tigrinho, o pônei que havia fugido em agosto de 2002, estava no pasto à espera do dono. A promessa havia sido atendida após o animal ter passado cinco meses no mato.
Netinho percorreu a trilha, orientado por setas amarelas, com outras sete pessoas, incluindo sua mãe, Geny Barros Peres Bilarva, 43. ""O caminho é tão bonito, com cachoeiras onde a gente pode se refrescar e brincar de escorregador, que eu nem me senti cansado", conta o menino.
Com mochila nas costas e cajado na mão, o grupo partiu de Águas da Prata rumo a Aparecida (167 km a nordeste de SP), um dos principais centros de romaria do país, no Vale do Paraíba, que recebe anualmente cerca de 7 milhões de devotos da padroeira do Brasil.
Geny não fez promessa, mas resolveu acompanhar o filho na caminhada para combater a síndrome do pânico (um distúrbio da ansiedade causado por problema emocional ou estresse).
"Na volta da caminhada, não senti mais a necessidade de tomar os remédios que eu vinha tomando havia dois anos. Agora estou pensando em fazer o caminho novamente para parar de fumar. Quero fazer a rota completa desta vez", diz ela, que em sua primeira empreitada foi com o filho até Paraisópolis (MG).
O primeiro trecho do Caminho da Fé que está sendo inaugurado tem 343 km. Acompanha quase toda a serra da Mantiqueira, passando pelo sul de Minas Gerais.
Em Águas da Prata, o peregrino poderá obter a partir de terça uma credencial, a ser carimbada nas paróquias ou em cada uma das 24 Pousadas do Peregrino que estão sendo criadas a cada 30 quilômetros, para a emissão da Mariana no final, em Aparecida.
O certificado da igreja equivale à Compostelana, emitida na Espanha àqueles que comprovam ter percorrido a maior parte da rota de peregrinação mais famosa do mundo ocidental, com cerca de 800 km, percorrida por cerca de 150 mil pessoas a cada ano.
O idealizador do caminho brasileiro, Almiro Grings, 62 -que já fez duas vezes a rota espanhola, além da dos incas, no Peru-, prepara a extensão da trilha até Tambaú (257 km ao norte), outro ponto tradicional de romaria, onde viveu o padre Donizetti Tavares de Lima, a quem são atribuídos mais de 700 milagres.
O segundo trecho, que completará a versão caipira do Caminho de Santiago, com um total de 415 quilômetros, deverá ser inaugurado em 16 de junho, data da morte do padre, ocorrida em 1961.
"Mesmo antes da oficialização da rota, muitos peregrinos, de várias partes do país e de diferentes religiões, têm nos procurado. Há um potencial incrível a ser explorado aliando o turismo ecológico a roteiros místicos", diz Grings.
Outro integrante do grupo desbravador da trilha, o paulistano Marcelo Cunha Bueno, 25, que se descobriu peregrino quase com a mesma idade de Netinho e já fez o Caminho de Santiago e a rota dos incas, no Peru, diz achar as belezas naturais dessa versão brasileira, que atravessa fazendas do século 19, ainda mais atrativas que as das outras trilhas místicas.
"As igrejas antigas e os bucólicos vilarejos não ficam nada a dever aos castelos medievais da Espanha. As montanhas são tão lindas quanto às dos incas", diz.
"Nos moldes de Santiago de Compostela, no Caminho da Fé não se cobra nenhuma taxa de inscrição dos peregrinos e as saídas são diárias", diz a peregrina Iracema Tamashiro, 51.



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