São Paulo, domingo, 09 de maio de 2010

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Aos 50, história da pílula é marcada por promessas quebradas

Medicação não acabou com gestações indesejadas nem reduziu divórcios ou controlou aumento da população

Onde é mais fácil adquirir a pílula do que na maioria dos países em desenvolvimento, até 50% de todas as gestações não são planejadas

ANDREA MURTA
DE WASHINGTON

Da revolução sexual à emancipação feminina, a pílula anticoncepcional, cuja aprovação nos EUA completa 50 anos hoje, já recebeu crédito por algumas das maiores revoluções sociais do século 20. Mas, a julgar pelas expectativas iniciais, sua história é marcada por promessas quebradas.
Ao ter a comercialização como contraceptivo liberada pelo FDA (órgão americano que regula remédios) em 9 de maio de 1960, a pílula foi recebida por médicos de todo o mundo como arma para acabar com gestações indesejadas, reduzir o número de divórcios e controlar o crescimento populacional e a pobreza.
Até hoje, nada disso aconteceu. Há mais de 100 milhões de mulheres que tomam a pílula no mundo hoje; por outro lado, das 200 milhões de gestações anuais, um terço, ou 75 milhões, são não planejadas.
As causas não estão relacionadas só ao acesso: nos EUA, onde é mais fácil adquirir a pílula do que na maior parte dos países em desenvolvimento, até 50% de todas as gestações não são planejadas.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o uso da pílula ainda é impedido por crenças religiosas e pessoais, falta de informação e mesmo falta de controle da mulher sobre seus direitos reprodutivos.
Nos anos 60, também era uma preocupação nos países desenvolvidos controlar a superpopulação global, que, temia-se, poderia desestabilizar sistemas políticos e sociais. Mas a pílula nunca foi realmente abraçada em países em desenvolvimento como forma de controle populacional.
"As esperanças eram totalmente irreais", diz a historiadora Elaine Tyler May, autora do recém-lançado "América e a Pílula: Uma História de Promessa, Perigo e Liberação" ("America and the Pill: A History of Promise, Peril, and Liberation", Basic Books). "Achavam que a pílula acabaria até com a Guerra Fria, pois retiraria a pressão populacional relacionada à época com guerras e comunismo."
Outro mito é o de que a pílula foi responsável pela revolução sexual. "Não é verdade, até porque a revolução sexual já se delineava nos anos 1950 e remonta à Segunda Guerra."
Além disso, disse May à Folha, pouquíssimas mulheres solteiras obtinham a pílula nos anos 1960 (era proibido), e nos anos 1970, a maioria das solteiras sexualmente ativas não usava nenhum método contraceptivo. "Quem esperava o fim dos nascimentos fora do casamento errou."
E pouco pode ser dito sobre fazer casamentos felizes, um efeito esperado do fim da preocupação com uma gravidez inesperada. No Brasil, por exemplo, o número de divórcios praticamente quintuplicou nas últimas duas décadas (de acordo com dados do IBGE), quando o acesso à pílula aumentou.
O que então a pílula realmente conseguiu? Segundo May, sua relação com o feminismo e a ascensão da mulher no mercado de trabalho são conquistas inegáveis. "Até 1960, não havia método seguro e dissociado do ato sexual que dava à mulher o poder de controlar sua fecundidade sem a colaboração ou mesmo conhecimento do parceiro."
Para Cecile Richards, presidente da ONG americana Planned Parenthood (planejamento familiar), a pílula "empoderou mulheres para decidir se queriam se educar mais ou buscar empregos antes de começar uma família". "Ela literalmente mudou a forma como vivemos", disse Richards.
Mas se a pílula participou das transformações vividas pelas mulheres no último meio século, pouco mudou acerca da responsabilidade sobre a reprodução. "A indústria farmacêutica já deu aos homens o Viagra. Mas onde está a pílula masculina?" questiona May.


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