São Paulo, terça, 9 de junho de 1998

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Desempenho de negros em exame é pior

do Conselho Editorial

Os coordenadores do exame quase optaram por esconder um dos resultados: o desempenho escolar dos negros.
O Saresp indicou que os negros se saíram pior do que os brancos, trazendo o temor, entre os coordenadores, de que esse dado fosse interpretado como sinal de inferioridade racial.
De acordo com a estatística, os negros têm uma habilidade média de 45% em língua portuguesa; os brancos, 51%. "Está aí uma das heranças vivas da escravidão", afirma Rose Neubauer.
Há vários fatores em jogo. Primeiro, os negros vêm, em sua maioria, das camadas mais pobres da população.
Há evidências de que o nível de renda dos pais está associado ao desempenho escolar. Até porque também se associam a escolaridade da mãe e o desempenho escolar do filho; quanto maior o estudo da mãe, melhor vai o filho.
É um círculo vicioso. Quem tem mais dinheiro pode comprar mais livros. O Saresp mostra que há uma relação entre o número de livros em casa e o desempenho.
Mais complexo, porém, é o fato de que os negros podem ter introjetado o preconceito dissimulado e dominante de que não teriam tanta capacidade intelectual como os brancos. Esse sentimento afetaria a auto-estima, fator fundamental ao aprendizado.
Há a suspeita de que esse preconceito conduziria, consciente ou inconsciente, professores a não apostar tanto no aprendizado dos alunos negros. Tão grave como o fator cor está a questão da idade. Os alunos que, por repetir o ano, são os mais velhos da classe, exibem desempenho pior.
Está provado que a repetência não tem valor pedagógico, apenas punitivo. O aproveitamento escolar dos repetentes é expressivamente inferior em matemática e língua portuguesa.
A partir deste ano, não haverá mais repetência, o que vai exigir programas de recuperação.
O Saresp detectou que ficar trocando o aluno de classe durante o aluno letivo provoca prejuízos, já que provoca o sentimento de não pertencer a um grupo Ämais uma vez, afeta a auto-estima.
Não se registraram defasagens graves no que diz respeito a sexo. As alunas da 4ª série conseguem ir melhor em língua portuguesa do que os meninos; 51,4% contra 48,9%. Mas os meninos se saem ligeiramente melhor em matemática: 50,5% contra 49,7%.
O fato evidente é que o desempenho escolar é reflexo da dívida social Älogo, a escola deve tentar compensar essa dívida, substituindo, em parte, o papel da família. Filhos de famílias educadas, capazes de propiciar visitas a museus, teatro, leituras, jogos educativos, tendem a ir melhor, independe da escola. (GD)


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