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MOACYR SCLIAR
On demand
Sim, eu sei que on demand é muito, muito, muito importante. Mas o que
isso significa mesmo? Anúncio publicitário, 5.nov.2003
Ela tinha 20 anos e era
uma ingênua mocinha do interior. Vivia com a mãe, viúva,
numa pequena casa; não trabalhava, não estudava. As duas se
sustentavam precariamente com
a pequena pensão do falecido
marido e pai, um homem que vivera e morrera em silêncio. Ela
não sabia exatamente o que fazer
de sua vida. Olhava televisão e sonhava com o príncipe encantado.
Que, pelo jeito, não morava na
pequena cidade; nenhum dos rapazes que conhecia lhe interessava. O que deixava a mãe inquieta: você precisa casar, minha filha, sua vida está passando,
quando você se der conta, será
tarde demais. Ela dava de ombros. O que podia fazer? Estava
ali, à disposição. Se alguém aparecesse, tudo bem.
Alguém apareceu. E de surpresa. Um dia surgiu por lá um senhor vindo da capital. O nome
dele era Robledo, e vinha a ser parente distante delas. Estava aproveitando a oportunidade de uma
viagem pela região para conhecer
esse modesto ramo da família.
Convidou-as para jantar, levou-as a passear em seu carro. A mãe
estava encantada. E quando notou que Robledo, que era viúvo,
estava interessado na moça, não
vacilou: esta é a sua chance de ouro, minha filha, você não pode
perder essa oportunidade. Ela
não sabia muito bem se gostava
do parente; sim, ele lhe parecia
simpático e mais, estava muito
bem de vida, mas não era bem
amor -pelo menos, não era nada parecido àqueles casos de tórrida paixão que via na TV. Contudo, respeitava tanto a mãe que,
quando o senhor Robledo a pediu
em casamento, respondeu que
sim, que casaria com ele.
Foram viver na capital. A mãe
não a acompanhou. Nasci aqui e
cresci aqui, disse, neste lugar eu
vou morrer. Além disso, alguém
precisava cuidar do túmulo do falecido, e esta tarefa ela não delegaria a ninguém. De modo que ficou lá no interior.
Os primeiros meses de vida conjugal foram muito bons -para
ela. O marido, empresário relativamente próspero, tratava-a
bem, levava-a ao teatro, a restaurantes. Mas a verdade é que parecia desapontado. Porque ela, apesar de bonitinha, aparentemente
não correspondia às suas expectativas. Era tímida demais, quieta demais. E, para falar a verdade, não era lá essas coisas na cama. Ele começou a sair sozinho à
noite. E voltava cada vez mais
tarde. Seguramente tinha outra.
Ou outras. Os telefonemas anônimos logo confirmaram as suspeitas: você é muito tola, garota, seu
marido trai você adoidado.
Finalmente, ela criou coragem e
resolveu interpelá-lo a respeito.
Que ele estivesse desapontado
com o casamento, era compreensível. Mas ela? Como é que ela ficava? Ele pensou um pouco e respondeu:
Você fica on demand.
Sim, ela sabe que é muito, muito importante estar on demand.
Mas o que isso significa, mesmo?
Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal.
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