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opinião
A ortotanásia e o que diz o direito penal
RICARDO BARBOSA ALVES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Difere da clássica idéia de
eutanásia, tão combatida por
leis e religiões, a supressão
ou limitação dos procedimentos que prolonguem a
vida de um paciente -a chamada ortotanásia, que recente resolução do Conselho
Federal de Medicina tenta
regulamentar.
Um olhar complacente verá na resolução uma prova de
humildade da ciência diante
das leis inexoráveis da vida.
Uma visão mais cautelosa
enxergará os perigos de dar
excessiva elasticidade ao
princípio da autonomia. É
mesmo sedutor o efeito tranqüilizante da transferência
de responsabilidade ao paciente. O consentimento desanuvia consciências, mas
terá algum valor? Há quem
diga que não: até nos desenganados o desejo de morrer é
sempre fugaz. Diz Elizabeth
Kübler-Ross: "Jamais tive
um paciente que quisesse
morrer de forma tão firme
que sua convicção resistisse
a uma longa conversa ou a remédios apropriados". Sobre
os perigos do consentimento
firmado por parentes, Clint
Eastwood e seu "Menina de
Ouro" falam por nós.
Como o direito penal deve
tratar da matéria? É uma
questão difícil de ser disciplinada por normas abstratas.
Mas não se esqueça que a lei
deve proteger a vida humana
como bem irrenunciável e
intangível. Não procede,
pois, a grita dos que dizem
que esse problema deve ficar
à margem do direito penal.
Não é recomendável que o
Estado renuncie ao direito
de exercer o controle sobre
ações que podem lesar bem
jurídico de tal magnitude.
Não se trata de uma defesa
intransigente da proliferação de medidas penalizadoras -e sim de garantir ao direito penal a faculdade de
buscar o justo equilíbrio entre as inclinações pessoais e
o interesse público na preservação do mais importante
dos direitos humanos.
Ricardo Barbosa Alves é promotor e mestre
em filosofia do direito pela PUC-SP
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