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Outra licitação da merenda está sob suspeita
Funcionário representou empresa adversária em pregão da prefeitura; vínculo indica que competição pode ter sido afetada
Ceazza mantém até hoje contrato que supera R$ 73 mi; contratos de merenda terceirizada também
são investigados
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
A empresa que fornece frutas, legumes, hortaliças e ovos
usados na merenda escolar da
rede municipal de São Paulo
obteve seu contrato -que já
passa de R$ 73 milhões- em
uma concorrência suspeita.
Um funcionário dela representou formalmente uma empresa adversária no pregão da
gestão Gilberto Kassab (DEM)
para adquirir os alimentos in
natura. Ele apresentou e negociou as propostas da concorrente -que perdeu e permitiu
ao verdadeiro patrão do funcionário ganhar a disputa.
A situação, documentada em
atas no "Diário Oficial", é indício de que, na prática, não houve competição entre as empresas, dizem especialistas.
O contrato da prefeitura com
a Ceazza Distribuidora de Frutas, Verduras e Legumes, firmado no final de 2006, tem validade até maio deste ano. Ela
foi a vencedora da licitação com
um preço 0,1% inferior ao da JJ
Comercial e 0,7% inferior ao da
Pontual Comercial Agrícola.
No pregão, a Pontual foi representada por Ezequiel Aparecido Rodrigues de Oliveira,
que é empregado formal do
grupo Ceazza há oito anos.
Especialistas em licitação
ouvidos pela reportagem avaliam que essa condição sinaliza
um vínculo que pode ter frustrado a disputa. Mas eles se dividem quanto à comprovação.
Professor da Fatec, Paulo Boselli diz que ela é suficiente para caracterizar uma "irregularidade por fraude à competição".
O fato de um funcionário ter
acesso prévio à proposta e à estratégia da concorrente também é contestado. "Afinal, será
que ele estava defendendo os
interesses da empresa A ou B?"
O advogado Carlos Ari Sundfeld avalia que a situação "é um
indício" de "acordo" que merece investigação, mas que ela
"não é suficiente, por si só, para
caracterizar a irregularidade".
Segundo Sundfeld, são frequentes os acertos entre empresas antes de licitações para
fazer "jogo de cena" e aparentar
"uma disputa que não existe".
O objetivo, diz, além da divisão de mercado, é garantir que
a concorrência não seja dada
como "fracassada". Ou seja, dar
legitimidade para que ela seja
mantida pelo poder público.
A lei de licitações considera
crime (sujeito a até quatro anos
de detenção) "frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo
do procedimento licitatório".
O contrato obtido pela Ceazza faz parte do modelo de autogestão da merenda escolar, pelo qual a prefeitura adquire os
alimentos e seus servidores
preparam a refeição dos alunos.
A administração Kassab
também adota outro modelo,
em mais de dois terços das escolas, pelo qual todos os serviços são terceirizados -a empresa compra os produtos, prepara a merenda e a entrega.
Esse contrato terceirizado já
é investigado pela Promotoria
por suspeita de conluio entre as
concorrentes no pregão de
maio de 2007, além da má qualidade de serviços e produtos.
O Ministério Público Estadual inclusive já recomendou
que a prefeitura substitua esse
modelo pelo de autogestão.
Uma das empresas investigadas é a SP Alimentação, a quem
a Ceazza é ligada. Eloizo Gomes
Afonso é sócio de ambas. Com
uma, fornece a comida escolar
terceirizada. Com outra, vende
os alimentos para a autogestão.
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