São Paulo, Sábado, 12 de Junho de 1999
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LETRAS JURÍDICAS

Um túnel no fim da luz

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Considerando a estatística das violências violentas e das violências amenas (se assim se pode dizer), está firmada na consciência do paulistano - ao menos na do paulistano - a certeza de que o viver é muito inseguro. Ricos e pobres concordam com a necessidade de adotar todas as cautelas para se prevenir contra a possibilidade, sempre presente, da morte violenta ou dos ferimentos graves.
Possibilidade que nosso sistema de legislar para a arquibancada, de olhos na mídia, com a proibição integral de armas, até para quem as tenha devidamente registradas, só pode agravar.
O perigo ronda a cada minuto do dia, gerando uma espécie de psicose no temor de abrir a porta, de casa ou do trabalho, de caminhar pela rua. Operários do direito, vestindo paletó e gravata, portando pastas, têm maiores motivos de preocupação.
Os meios oficiais de combate à criminalidade são evidentemente falhos. Os meios privados só valem para os muito ricos. Têm seus seguranças (que, às vezes, se transformam em sequestradores), seus carros blindados (que já não servem para armas pesadas), circuitos eletrônicos de proteção, veículos rastreados por meio de satélites, mas continuam inconformados com o avanço do crime.
Os pobres, remediados ou muito pobres, se assustam com os bandidos e com as polícias, proverbialmente desatentas do dever de respeito aos que não têm costas quentes para reagir.
Sejamos justos: polícia mal remunerada, submetida a rotinas rudes de trabalho, ela mesma sem convicção de sua própria segurança e principalmente a de sua família, não transfere a sensação de segurança aos cidadãos.
Certo é que os meios tradicionais de profilaxia do crime, de sua rápida apuração, quando cometido, do eficaz processo judicial, quando desvendado, do recolhimento do condenado a estabelecimentos prisionais minimamente dignos, depois do devido processo legal, não funcionam bem. Em nenhum de seus passos.
Considerar crime inafiançável a propriedade de armas registradas corresponde a querer transformar todo cidadão, que o Estado não protege, em criminoso potencial.
É assente que prisão não desestimula delitos, nem educa. Fala-se de métodos eletrônicos, genéticos, ou químicos de controle. Já se cogita, em alguns países, a inserção de mecanismos aptos a "desligarem" o criminoso, quando ele ultrapasse um certo nível de irritação ou de excitação nervosa, contrapostos aos direitos desses párias, agentes e consequentes da instabilidade urbana, agressores e vítimas, carecedores muitos deles de tratamento adequado para lhes retirar os mecanismos de violência.
A criminalidade sugere, na visão do curto prazo, a angústia social presente, cujo estigma da violência crescente parece evoluir geometricamente. Desestabiliza pobres e ricos, estes a se sentirem paradoxalmente mais tranquilos atrás de suas próprias grades.
Cabe-nos pensar se não está na hora de assumirmos definitivamente a insuficiência dos meios clássicos e de imaginarmos (ou realizarmos) alternativas novas que a ciência, a sociologia, a psicologia e o que mais seja possam implementar.
A longo prazo parece que chegaremos ao sucesso. Mas, por ora, não há razão para otimismo. Quando se transforma a proibição de armas legalmente adquiridas e legalmente registradas em remédio milagroso para resolver a criminalidade, nasce o túnel escuro pelo qual os criminosos fugirão ou retornarão para reincidir na delituosidade incontrolada.



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