São Paulo, quinta-feira, 12 de agosto de 2004

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SEGURANÇA

Defesa de ex-motorista condenado por seqüestro entrega a TJ fotos de suposta agressão; polícia não reconhece local

Preso alega tortura em delegacia e pede anulação de júri

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um ex-motorista condenado a 33 anos de prisão pelo seqüestro e assassinato de um estudante de 19 anos pediu a anulação de seu julgamento ao Tribunal de Justiça de São Paulo alegando que sua confissão foi obtida mediante tortura, no porão do casarão que abriga a Divisão Anti-Seqüestro (DAS).
Para provar sua tese, a defesa do acusado entregou ao tribunal 19 fotografias da suposta agressão. As imagens teriam sido feitas por um policial da própria DAS, que as teria vendido por R$ 15 mil.
A história veio a público ontem, nas páginas do "Jornal da Tarde", que publicou duas dessas fotos. Nas cenas aparece um chão avermelhado. Esse é um dos argumentos usados pela Polícia Civil para rebater as acusações.
"O local que aparece nessas duas imagens, as únicas que vi, não existe na DAS", disse o diretor da divisão, Wagner Giudice.
O preso em questão é Eduardo Mateus Catarino, 38, acusado de seqüestrar e matar Charles Wo Jihn Chang, 19, em 27 de julho de 2002. Catarino foi motorista da empresa recicladora de borracha do pai do estudante e era responsável por levar à escola o rapaz e sua irmã. Cinco meses antes do seqüestro, foi demitido "por atrasos", segundo um tio de Chang.
"Ele era o melhor amigo do menino. Prometia que ia ensiná-lo tiro ao alvo, e ele ficou apaixonado pela idéia", disse o tio, que preferiu não ter o nome citado.
A família de Chang não tem dúvidas da culpa de Catarino. Em uma carta à imprensa, o tio do rapaz define os policias como "heróis" e se diz "indignado" com as acusações. O texto termina com "os agradecimentos a quem tanto nos auxiliou num pesadelo".
Chang foi morto no mesmo dia de seu desaparecimento e teve o corpo incinerado. Apesar disso, os criminosos ainda receberam R$ 42 mil dos R$ 700 mil que exigiam de resgate. "A polícia tinha provas suficientes contra Catarino. Portanto, não precisava bater nele", continua o tio, comentando os motivos pelos quais duvida da agressão denunciada.
A família de Chang e a polícia listam o que seriam as cinco principais provas contra Catarino:
1) o primeiro telefonema dos seqüestradores, feito no dia do sumiço do estudante, foi atendido pela irmã do rapaz; ela, segundo o tio, reconheceu a voz de Catarino nessa e em outras ligações;
2) em uma das interceptações feitas no telefone do ex-motorista, ele confessa o crime a um interlocutor, segundo Wagner Giudice;
3) sob a cama de Catarino, numa caixa, estavam os óculos de sol que Chang usava quando deixou sua casa, para se encontrar com o ex-motorista, no dia do crime -numerado, o objeto teve a nota fiscal localizada na casa do rapaz;
4) a balística confirmou que os tiros que atingiram Chang saíram de uma arma localizada com um motoboy que seria cúmplice de Catarino e que aponta o ex-motorista como autor dos disparos;
5) Catarino indicou o local onde o corpo havia sido queimado -era em Santa Branca (93 km de SP), cidade onde fica o sítio onde eles treinavam tiro ao alvo.
Além de listar as provas, a polícia questiona os motivos pelos quais a família do acusado só juntou as fotos ao processo em outubro do ano passado, após a defesa ter apelado ao TJ, se elas são datadas de 8 de agosto de 2002.
"E em 8 de agosto a confissão já havia sido obtida e o corpo [de Chang] estava sendo exumado. Não havia nem em tese algum motivo para agressão", prosseguiu Giudice.
O advogado do ex-motorista, Miguel da Silva Lima, afirma que a família teve medo de retaliações. Procurados, os pais do preso não quiseram comentar o caso. O pai do acusado tem pressão alta e não estaria passando bem.
No final da tarde, a Polícia Civil ainda apresentou retratos que teriam sido feitos de Catarino em 2 de agosto de 2002. A intenção dos delegados foi destacar que, nessas imagens, supostamente feitas uma semana antes das cenas de agressão, o preso está mais magro e tem os cabelos bem mais curtos.
A Folha não teve acesso ao processo no qual Catarino é réu, pois desde o último dia 28 ele está nas mãos do desembargador Pires de Araújo, que deve decidir se o julgamento será ou não anulado.


Colaborou VICTOR RAMOS, free-lance para a Folha


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