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Carta de líder comunitário revela que ele pediu ajuda antes de desaparecer
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
Antes de desaparecer, o ex-presidente da Associação de
Moradores da favela Kelson's,
no bairro da Penha, zona norte
do Rio, Jorge da Silva Siqueira
Neto, 34, expulso da comunidade por uma milícia, pediu ajuda
a instituições policiais e políticas e ao Ministério Público. Ele
dizia estar sendo ameaçado de
morte. Nada de concreto, porém, foi feito para ajudá-lo.
A polícia do Rio investiga a
denúncia de que Siqueira Neto
foi capturado e, supostamente,
assassinado.
Carta escrita pelo líder comunitário dois meses antes de
desaparecer relata a atuação da
milícia na Kelson's, as ameaças,
sua expulsão da favela e a busca
infrutífera de apoio. O documento foi obtido pela Folha.
Siqueira Neto desapareceu
na sexta-feira da semana passada. Parentes e testemunhas
ouvidas pela Polícia Civil disseram que ele foi baleado por ao
menos cinco homens e colocado em um carro, no subúrbio
de Rocha Miranda,que também fica na zona norte.
A polícia suspeita que um
corpo mutilado e carbonizado
achado no fim de semana em
Campo Grande (zona oeste) seja o de Siqueira Neto. Houve
até um reconhecimento informal pela mulher dele, mas a polícia espera pelo resultado do
DNA. Ontem, os pais do líder
comunitário colheram material para a realização do exame.
Na carta, Siqueira Neto afirmou que pediu ajuda às seguintes instituições desde que foi
expulso da favela, em abril: Comissão de Direitos Humanos
da Assembléia Legislativa, Corregedoria Interna da PM (Polícia Militar), Corregedoria Geral Unificada das Polícias, Secretaria Estadual de Segurança
Pública, Ministério Público do
Estado, 1ª Delegacia Judiciária
da PM,16º BPM (Batalhão de
Polícia Militar) e 22ª DP (Delegacia de Polícia).
"Um grupo de extermínio
composto por cinco policiais
militares invadiu, com seus colaboradores, a comunidade, e
desde então vivemos uma verdadeira ditadura. Nesses quase
nove meses de ocupação, (...)
tenho contabilizado cerca de
200 mortos", escreveu ele.
Com base no depoimento de
Siqueira Neto à Corregedoria
Geral Unificada da Secretaria
de Segurança, foi aberto na
Draco (Delegacia de Repressão
às Ações Criminosas Organizadas) um inquérito sobre a milícia. No depoimento, o líder comunitário deu os nomes dos cinco PMs que acusava. Três
deles foram presos administrativamente no fim de agosto,
mas deixaram a prisão no dia 3.
Quatro dias depois, Siqueira
Neto desapareceu. Ontem, dois
dos cabos da PM acusados de
chefiar a milícia foram presos.
Pai de seis filhos, o ex-presidente da associação passou a
viver de favor, pois os milicianos tomaram seu trailer de
sanduíches e o depósito de gás
que a família dele mantinha na
favela havia cerca de 30 anos.
Para se esconder, dormia a cada dia em um local diferente.
Ele não tinha dinheiro nem
para comer. Nos últimos meses, líderes comunitários de
outras favelas lhe davam cestas
básicas. Com a prisão dos PMs
que acusava, Siqueira Neto se
expôs mais. Amigos contam
que ele parecia ter recobrado a
confiança nas autoridades.
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