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CONTRA
Muro ou trincheira?
SÉRGIO MAGALHÃES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Cercar favelas da zona sul
com muros é uma resposta de
natureza semiológica a uma
questão política. Sabemos que
essas áreas estão relativamente
contidas, por obstáculos naturais ou por limites construídos.
Morros da zona sul tiveram a
sua área florestada expandida.
Não obstante, as favelas, como quaisquer outros elementos urbanos, não podem dispor
do território indistintamente.
É do interesse da cidade e dos
próprios assentamentos.
A ocupação limitada, que
preserva as infraestruturas implantadas, é consensual entre
moradores e governos. Obras
do Favela-Bairro construíram
limites facilmente identificáveis. Onde possível, com muros, largos, mas de apenas 30
cm de altura, como no Vidigal.
No entanto, a violência que
assola nossas cidades tem produzido um sentimento de estranhamento em relação à diversidade. Bastamo-nos em
nossos iguais. Diferente, a favela tem sido estigmatizada como
lugar que dá causa à violência.
É como se, sem favelas, a cidade
se tornasse pacífica.
Ora, a violência tem outras
matrizes, onde a morfologia urbanística por certo não tem
protagonismo. Podem ser inseguros lugares com ruas retas e
edifícios regulares; há favelas
com e sem violência.
A questão é de natureza política porque ela se estrutura na
escassez de democracia. Territórios inteiros onde habitam
milhares de cidadãos se encontram sob domínio de bandidos,
que impõem suas próprias leis.
São territórios pobres, sejam
favelas, loteamentos ou conjuntos residenciais. Dominados pelo tráfico ou por milícias,
dissemina-se a violência.
Mas o clamor contra a violência é gigantesco, com razão;
a indignação é enorme; o medo
aumenta. O governo reage muito bem quando anuncia a retomada dos territórios e a permanência da legalidade. Não reage
tão bem quando confere aos
muros um papel que serão incapazes de desempenhar. Na
eventualidade desses territórios permanecerem no descontrole, os muros podem virar
trincheiras para os marginais.
A incorporação ao Estado democrático dos territórios hoje
na anomia construirá os muros
mais poderosos contra a violência, bem como limites mais
efetivos contra o crescimento
de favelas. Tal é a resposta política que desejamos.
SÉRGIO MAGALHÃES, arquiteto, professor da
FAU-UFRJ, foi secretário de Habitação do Rio de
Janeiro (1993-2000).
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