São Paulo, quarta-feira, 13 de maio de 2009

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GILBERTO DIMENSTEIN

Rua da moda


Câmera na mão, Bia Ferrer circula à procura do inusual, de um detalhe que expresse a busca da autenticidade


BIA FERRER cursou psicologia no Mackenzie na suposição de que o estudo das profundezas da mente poderia ajudá-la a se tornar escritora. Preferiu, porém, a superfície das aparências. Tornou-se fotógrafa especializada em moda, cercada de magérrimas manequins, flashes, maquiagens e figurinos -tudo isso retocado no Photoshop-, mas uma experiência jogou-a na rua.
Não deixou o estúdio. Mas, desde o ano passado, ela se dedica, nas horas vagas, caminhando por São Paulo, a investigar a moda desenhada na rua pelos anônimos, como se fizesse uma análise psicológica de uma cidade. "Estou tentando traduzir a alma de uma cidade", conta Bia, que, entre dezenas de tatuagens, exibe em seu corpo frases em inglês, francês e árabe.

 


Um fato tirou Bia da faculdade de psicologia: um curso sobre pacientes terminais. Não queria fazer uma visita aos hospitais onde estavam esses pacientes. Para não ficar sem nota, propôs uma troca: um trabalho sobre a arte dos túmulos. Troca aceita, passou a documentar o cemitério da Consolação.
Foi aí que descobriu a fotografia combinada com a arte. Quando saiu da faculdade, conseguiu estágio como assistente num estúdio de moda e, com o tempo, abriu sua empresa.
No ano passado, preferiu deixar um pouco de lado a artificialidade dos flashes de seu estúdio e trocá-la pela luminosidade das ruas. "Queria documentar a moda real, aquela feita pelas pessoas comuns. Mas o que me interessa mesmo é gente que se destaca na multidão."
 


Tanto pode ser um garçom, um pastor, um vendedor, um carroceiro, um rapper, um mano, um mendigo, executivos, donas de casas, aposentados, mães de santo, como punks, góticos, emos, roqueiros, patricinhas e mauricinhos. Máquina fotográfica na mão, ela circula pelos bairros à procura do inusual -às vezes, um simples detalhe que expresse a busca da autenticidade.
Não basta fazer parte de uma tribo. É preciso se destacar, por algum detalhe, dessa tribo. "Meu foco são as pessoas que buscam a originalidade e ousam, mesmo que, para os outros, possam parecer ridículas. É que elas têm coragem de tentar ser elas mesmas." Um de seus personagens é um pastor, Bíblia na mão, com seu terno característico, mas que se distingue pela gravata roxa.
 


Sua coleção já está com 2.000 fotos; serão tiradas mais mil fotos. Ainda não sabe exatamente o que fazer com todo esse material. Já montou um blog, mas gostaria de ver tudo isso exposto nas estações do metrô, nos museus e até nas escolas de moda.
 


PS- Enquanto a exposição não vem, uma seleção das fotos pode ser vista no catracalivre.com.br, onde, aliás, resolvi incluir as imagens da Bia Ferrer -afinal, ela, com seu corpo transformado em página de livro, poderia ser um dos seus próprios personagens.

gdimen@uol.com.br


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