São Paulo, terça-feira, 13 de julho de 2004

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TRANSPORTE

Líderes de ato contra reajuste de tarifa em SC se declaram trotskistas-leninistas; mobilização começou em fevereiro

Protestos são parte de "revolução juvenil"

James Tavares/"A Notícia"
Estudantes protestam contra o reajuste nas tarifas de ônibus, na avenida Paulo Fontes, no centro de Florianópolis


MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM FLORIANÓPOLIS

Dois estudantes que se dizem descrentes dos partidos políticos brasileiros, mas que acreditam na revolução juvenil, foram os protagonistas dos protestos que provocaram a suspensão do reajuste das tarifas de ônibus de Florianópolis (SC), na semana passada.
Marcelo Pomar, 22, e Lucas de Oliveira, 23, estavam à frente do movimento pelo passe livre estudantil na capital de Santa Catarina. A partir do reajuste de 15,6% aplicado às tarifas do transporte urbano no final de junho, conseguiram envolver também a população nos protestos contra o aumento. Na cidade, estudante paga meia passagem.
As manifestações que tumultuaram o centro da cidade durante dez dias tiveram planejamento de Pomar, Oliveira e de outros cerca de 30 ativistas da JRI (Juventude Revolução Independente).
O grupo se declara trotskista-leninista -"camarada" é o tratamento usual entre eles pessoalmente e nos bate-papos na internet-, nega pertencer a um movimento nacional organizado e se diz líder de si mesmo.

Organização
A mobilização contra o aumento iminente das passagens começou em fevereiro deste ano. Pomar e Oliveira começaram a exibir nas escolas secundaristas e nas universidades o filme "A Revolta do Buzu", que o cineasta Carlos Pronzato produziu a partir da onda de protestos de estudantes de Salvador contra o reajuste da tarifa, no ano passado.
"Conseguimos duas fitas e acho que exibimos para mais de mil estudantes", diz Oliveira.
Estudante de química da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Oliveira é paulista, mas começou a luta estudantil como cara-pintada do "Fora Collor" -movimento para o impeachment do então presidente Fernando Collor-, no Rio.
Há quatro anos em Florianópolis, ele diz ter participado de movimentos pelo passe livre em Franco da Rocha e em Cotia, no interior de São Paulo, e afirma não se importar com a pecha de ser um "estrangeiro" na ilha. "A luta que eu travo aqui é a mesma que vou tocar em qualquer lugar deste mundo."

Lideranças
O discurso fluente na defesa das idéias confere a Oliveira um ar de "cérebro" do grupo. É dele a proposta da "empresa da revolução" -idéia de auto-sustentação da JRI que virou nota em um dossiê produzido contra o movimento em Florianópolis. Inspirada em ensinamentos de sobrevivência financeira de Lênin, a "empresa" produz e vende camisetas, bonés e outros acessórios para manter o caixa. Não há fábrica, mas os produtos da "grife" estão à venda em sete lojas populares da cidade.
"Ainda pretendemos montar uma loja. Por enquanto, essa produção não nos dá mais que R$ 300 por mês", diz Pomar.
Estudante de história na Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina), Pomar é o jovem de linha de frente do grupo. Tamanha exposição já lhe rendeu uma ameaça de morte registrada na Polícia Civil e um "interdito proibitório" da Justiça do Estado.
Se visto em aglomerações de protesto, pode ser preso. Facilmente reconhecido, também diz enfrentar dificuldades para pegar um ônibus nos terminais que interrompeu várias vezes nos protestos das últimas semanas.
Natural de Belém (PA) e criado em São Paulo -e agora fazendo de Florianópolis sua "opção de vida"-, Pomar traz a política de herança. Fala orgulhoso que é bisneto de Pedro Pomar, dirigente do PC do B que foi morto pelo 2º Exército em 1976, em São Paulo, durante o episódio da "Chacina da Lapa". O corpo do bisavô foi identificado em 1980, no cemitério Dom Bosco, em Perus. Ele tinha sido enterrado com nome falso. O avô do estudante, Wladimir Pomar, foi coordenador da campanha de Lula em 1989.
Os jovens Pomar e Oliveira militaram nas tendências "Trabalho" e "Articulação de Esquerda", do PT, que deixaram para trás em 2001. Os dois afirmam não ter votado em Luiz Inácio Lula da Silva em 2002.
"O Brasil está carente de lideranças políticas capazes de mobilizar a luta nas ruas e as organizações partidárias de juventude que a gente vê hoje são ótimas para formar burocratas de gabinete, administradores políticos e assessores parlamentares, mas o que a gente precisa é de gente que organize a luta nas ruas", diz Pomar.


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