São Paulo, quinta-feira, 13 de agosto de 2009

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Nova lei faz tabacaria "expulsar" fumantes

Para continuar a servir bebida e comida, a Ranieri vetou o fumo em seu interior

"O pessoal compra o charuto e fuma fora", explica o proprietário, que criou na calçada um espaço, como uma praça, para os clientes

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

A Tabacaria Ranieri, na alameda Lorena, Jardins, até poderia permitir que seus clientes fumassem em seu interior. A lei antifumo em vigor desde o dia 7 abre essa exceção para estabelecimentos que são como ela é, especializados na venda dos chamados "produtos fumígenos" (charutos, cigarros, cigarrilhas, cachimbos e tabaco). Mas, em vez de aproveitar a excepcionalidade de sua condição, o proprietário da loja, Roberto Ranieri, escolheu o caminho oposto. E expulsou os fumantes.
Ontem, sob garoa fina e frio de 16C, três clientes da tabacaria, envoltos em grossos rolos de fumaça, encolhiam-se sentadinhos em bancos de jardim, na calçada -um deles era o ator Cássio Gabus Mendes.
"Olha só como São Paulo está evoluindo. Agora, tem até seus clochards", gargalhava, do outro lado da rua, a professora aposentada Maria Isabel de Nogueira Pereira, 70. Ela referia-se aos três homens, um deles de terno, o outro bebendo um aperitivo Fernet Branca, dois fumando charutos, um tragando um cigarro, todos ao relento. Comparava-os aos folclóricos -e não raro chiquérrimos- moradores de rua de Paris.
A Tabacaria Ranieri é um dos pontos mais frequentados pelos aficionados dos elegantes puros habanos. Surgiu há 23 anos, antes de Montecristo e Cohiba tornarem-se pauta obrigatória em revistas voltadas para o público masculino classe A. Com o tempo, Ranieri colocou um cafezinho, água, bebidas, sanduíches e petiscos para acompanhar as baforadas. "É imprescindível, porque charutos não são como cigarros, fumados em poucos minutos. O charuto é algo que se saboreia enquanto se conversa -dura horas", explica o proprietário.
Mas veio a lei antifumo e Ranieri teve de escolher: ou deixava o interior da loja para os fumantes exercerem seu tabagismo ou dedicava o espaço para as demais atividades. Deixou para as últimas. Achou que perderia menos assim. "O pessoal compra o charuto e fuma fora."
Ele até contratou um paisagista, para dar um trato "lá fora". Vasos floridos de manacás foram colocados entre os quatro bancos de madeira, como numa praça. Também providenciou mesas desmontáveis, para abastecer de bebidas e comidinhas os clientes. É duro.
Não bastasse o tempo ruim de ontem, convenha-se, é preciso ser zen demais para bebericar um conhaque ou traçar um sanduíche em local totalmente aberto.
"Essa lei criou uns absurdos", diz a babá Valdemira dos Santos Silva, que passou com o carrinho de bebê no meio da nuvem de fumaça dos três "clochards". "Antes, eles fumavam lá dentro e a gente nem via. Agora, não. A calçada é estreita e a gente ainda tem de dividi-la com bancos, pernas e charutos."
Ranieri gostaria que a lei em São Paulo fosse como a do Rio de Janeiro, que permite à tabacaria vender outros produtos (bebida e comida, por exemplo), bastando apenas que mais da metade de sua receita provenha de fumígenos. "É o meu caso", diz ele. Segundo a contabilidade da loja, algo como 70% do faturamento provém dos derivados do tabaco (consumidos ou não no próprio local).


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