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foco
Na favela Pé Sujo, achar um barraco pelo número é missão quase impossível
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
Achar um barraco específico no Pé Sujo é missão que
beira o impossível. Ter o endereço em mãos não adianta
muito nessa favela da zona
leste de São Paulo espremida
entre o rio Tietê, um conjunto habitacional, um hipermercado, um viaduto e a linha do trem.
A única rua reconhecida
pelos Correios, a Nicolas
Jardim, acaba na entrada da
favela. A partir dali, incontáveis vielas se ramificam.
Quem vive naquele labirinto,
não importa a viela, dá como
endereço de casa a mesma
Nicolas Jardim.
Cada morador pintou na
porta de seu barraco -são
3.000- o número que bem
entendeu. Não há lógica. Os
números estão embaralhados, muitos são repetidos.
"Várias vezes o caminhão
das Casas Bahia bateu lá em
casa para entregar sofá que
não era meu, que era de alguém lá do meio da favela
que tinha o mesmo número", conta o mecânico Moacir Sanches, 52, que mora
nos poucos metros reconhecidos da rua Nicolas Jardim.
E houve casos mais graves.
Após denúncia anônima, policiais derrubaram a porta do
barraco 85 à procura do suposto cativeiro de uma pessoa seqüestrada. A velhinha
que morava no casebre não
entendeu nada. Os oficiais
haviam invadido o 85 errado.
Como os carteiros não entram no Pé Sujo, toda a correspondência é deixada na
entrada da favela. Há quatro
anos, as cartas são levadas
para o Bar do Zé do Gás, um
estabelecimento escuro que
também faz as vezes de padaria e açougue. Os envelopes ficam dentro de uma caixa de papelão, sobre uma
mesa amarela enferrujada.
O bar vive cheio. Há sempre alguém revirando as dezenas de cartas. A correspondência esperada, porém,
nem sempre é encontrada.
"Nunca chegou à minha mão
o cartão do Bolsa Família
que a minha mãe me mandou lá do Norte", queixa-se a
dona-de-casa Rosicleide da
Silva, 28. "Só podem ter pegado. Tem gente que não
tem consciência."
O líder comunitário Reginaldo Belarmino, o Alemão,
40, tentou convencer a prefeitura a dar nomes às vielas
e pôr ordem nos números -a
favela contrataria seus próprios carteiros. Em vão. A
prefeitura respondeu que
não pode legitimar uma ocupação irregular.
Agora o líder comunitário
tenta mudar o nome da favela para Jardim América Penha. "Imagina a criança que
cresce dizendo que mora no
Pé Sujo? Isso não é nome."
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