São Paulo, domingo, 14 de outubro de 2007

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Ex-diretor relata em livro irregularidades no HC

Waldemir Rezende conta casos que vão de desvio de remédios a furto de material

Uma única empresa fornecia feijão, fio cirúrgico, luvas, canetas, lápis e camisinhas ao Hospital das Clínicas de São Paulo

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ex-diretor do Instituto Central do Hospital das Clínicas de São Paulo, o médico Waldemir Rezende, 48, decidiu colocar no papel casos do submundo do maior complexo hospitalar da América Latina. São histórias de superfaturamento, compras sem licitação e furtos, entre outras irregularidades que encontrou no HC quando assumiu o cargo, em dezembro de 2002.
O resultado é o livro "Estação Clínicas", que ele lança na próxima quinta, Dia do Médico, em São Paulo. Por cautela, Rezende não cita nomes de envolvidos, mas diz que todos os casos foram documentados e transformados em sindicâncias internas e BOs (boletins de ocorrência). O instituto tem orçamento mensal de R$ 7 milhões.
"A idéia foi registrar como encontrei o hospital e a oportunidade que tive de modificar a situação. Depois que você informatiza uma farmácia que atendia 1.800 pacientes por dia, gastando R$ 3,5 milhões por mês em medicamentos, e passa a atender 3.800 por dia, com os mesmos R$ 3,5 milhões, as pessoas perdem o referencial", afirma ele.
Entre as histórias, ele conta que o HC comprava, de uma única empresa, feijão, fio cirúrgico, luvas, camisinhas, canetas, lápis e dezenas de outros itens, quase sempre superfaturados ou de má qualidade e sem aplicar nenhuma punição.
"As empresas assediam, trazem presentinho, fazem jantar, conseguem patrocínio para não sei o quê. Esse assédio "amolece o coração". Eu não posso ter coração amolecido. Tenho que ter o melhor material pelo menor preço", diz.

Faltando produto
Em outro episódio, Rezende relata que o hospital comprava caixas de luvas fechadas faltando até 20% das unidades e também chegou a adquirir um equipamento velho pelo preço de um novo. Há casos também de desvios de medicamentos, de furtos de materiais (de sifão de banheiro a retroprojetor, o que rendia, em média, 40 boletins de ocorrência mensais).
"A inércia, o descaso crônico, coloca o sistema em descrédito. As pessoas acham que não adianta, é só uma luva, que custa R$ 0,08. Aí eu falo: "sabia que a gente usa 300 mil pares por mês? Multiplica 300 mil por R$ 0,08'", diz ele.
Rezende relata que conseguiu "fechar o ralo" com ações como a informatização da farmácia do HC (onde estão R$ 3,5 milhões mensais) e a instalação de 7 km de fibras óticas e 129 câmeras, um verdadeiro "big brother" hospitalar. Hoje, reúne quase mil fotos de antes e de depois dessas mudanças.
Oito meses após encerrar o mandato administrativo de quatro anos, o médico, que tem especialização em gestão hospitalar pela FGV, continua atuando no HC como ginecologista, no setor de tumores na gravidez.
Em tempo: o título do livro é uma referência direta à obra "Estação Carandiru", mas ele alega que a única comparação é o formato do prédio. "Visto de cima, o prédio do HC é muito parecido com o antigo complexo do Carandiru", diz ele.
O secretário estadual da Saúde, Luiz Barradas Barata, e o superintendente do HC, José Manoel Teixeira, não se manifestaram sobre o conteúdo do livro. Por meio das assessorias de imprensa, disseram desconhecer os fatos e preferiram não se pronunciar.


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