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Ex-diretor relata em livro irregularidades no HC
Waldemir Rezende conta casos que vão de desvio de remédios a furto de material
Uma única empresa fornecia feijão, fio cirúrgico, luvas, canetas, lápis e camisinhas ao Hospital das Clínicas de São Paulo
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Ex-diretor do Instituto Central do Hospital das Clínicas de
São Paulo, o médico Waldemir
Rezende, 48, decidiu colocar no
papel casos do submundo do
maior complexo hospitalar da
América Latina. São histórias
de superfaturamento, compras
sem licitação e furtos, entre outras irregularidades que encontrou no HC quando assumiu o
cargo, em dezembro de 2002.
O resultado é o livro "Estação
Clínicas", que ele lança na próxima quinta, Dia do Médico, em
São Paulo. Por cautela, Rezende não cita nomes de envolvidos, mas diz que todos os casos
foram documentados e transformados em sindicâncias internas e BOs (boletins de ocorrência). O instituto tem orçamento mensal de R$ 7 milhões.
"A idéia foi registrar como
encontrei o hospital e a oportunidade que tive de modificar a
situação. Depois que você informatiza uma farmácia que
atendia 1.800 pacientes por dia,
gastando R$ 3,5 milhões por
mês em medicamentos, e passa
a atender 3.800 por dia, com os
mesmos R$ 3,5 milhões, as pessoas perdem o referencial",
afirma ele.
Entre as histórias, ele conta
que o HC comprava, de uma
única empresa, feijão, fio cirúrgico, luvas, camisinhas, canetas, lápis e dezenas de outros
itens, quase sempre superfaturados ou de má qualidade e sem
aplicar nenhuma punição.
"As empresas assediam, trazem presentinho, fazem jantar,
conseguem patrocínio para não
sei o quê. Esse assédio "amolece
o coração". Eu não posso ter coração amolecido. Tenho que ter
o melhor material pelo menor
preço", diz.
Faltando produto
Em outro episódio, Rezende
relata que o hospital comprava
caixas de luvas fechadas faltando até 20% das unidades e também chegou a adquirir um
equipamento velho pelo preço
de um novo. Há casos também
de desvios de medicamentos,
de furtos de materiais (de sifão
de banheiro a retroprojetor, o
que rendia, em média, 40 boletins de ocorrência mensais).
"A inércia, o descaso crônico,
coloca o sistema em descrédito.
As pessoas acham que não
adianta, é só uma luva, que custa R$ 0,08. Aí eu falo: "sabia que
a gente usa 300 mil pares por
mês? Multiplica 300 mil por
R$ 0,08'", diz ele.
Rezende relata que conseguiu "fechar o ralo" com ações
como a informatização da farmácia do HC (onde estão R$ 3,5
milhões mensais) e a instalação
de 7 km de fibras óticas e 129
câmeras, um verdadeiro "big
brother" hospitalar. Hoje, reúne quase mil fotos de antes e de
depois dessas mudanças.
Oito meses após encerrar o
mandato administrativo de
quatro anos, o médico, que tem
especialização em gestão hospitalar pela FGV, continua
atuando no HC como ginecologista, no setor de tumores na
gravidez.
Em tempo: o título do livro é
uma referência direta à obra
"Estação Carandiru", mas ele
alega que a única comparação é
o formato do prédio. "Visto de
cima, o prédio do HC é muito
parecido com o antigo complexo do Carandiru", diz ele.
O secretário estadual da Saúde, Luiz Barradas Barata, e o
superintendente do HC, José
Manoel Teixeira, não se manifestaram sobre o conteúdo do
livro. Por meio das assessorias
de imprensa, disseram desconhecer os fatos e preferiram
não se pronunciar.
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