São Paulo, sábado, 14 de novembro de 2009

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ANÁLISE

Comer cachorro é um fato antropológico

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Que coreanos comam cachorros é um fato antropológico que não deveria causar maior surpresa nem revolta.
Franceses deliciam-se com cavalos e rãs, chineses devoram tudo o que se mexe -aí inclusos escorpiões e gafanhotos- e boa parte das coisas que não se mexem também. Os papuas da Nova Guiné, até algumas décadas atrás, fartavam-se no consumo ritual dos miolos de familiares mortos. Só pararam porque o hábito estava lhes passando o kuru, uma doença neurológica grave.
Nosso consolidadíssimo costume de comer vacas configura, aos olhos dos hinduístas, nada menos do que deicídio.
A não ser que estejamos prontos a definir e impor um universal alimentar, é preciso tolerar as práticas culinárias alheias, por mais exóticas ou repugnantes que nos pareçam.
Nada disso justifica o abate, por meios cruéis, de cães num matadouro clandestino em Suzano. Mas, observadas as exigências humanitárias, de higiene e fiscais, não há por que impedir coreanos de seguir com suas preferências culinárias.
A cidade de São Paulo conta hoje com mais de 1,6 milhão de cachorros. Por mais que simpatizemos com os cães, eles chegaram a uma situação de descontrole populacional, que precisa ser remediada.
É claro que não o faremos devorando os animais excedentes. Mas a solução tampouco virá de medidas populistas como a lei paulista nº 12.916/08, que, exceto em casos muito especiais, proibiu os órgãos de controle de zoonoses de proceder à eutanásia de cães e gatos.
O resultado foi que esses serviços praticamente pararam de recolher animais. Como a natureza segue seu curso, em vez de ser sacrificados sem dor, eles acabam morrendo vítimas de atropelamentos e doenças.
Pesquisa de veterinários de USP, Unip, Unicsul e Metodista mostrou que, mesmo antes da introdução da lei, os cães da região metropolitana de SP viviam só três anos, contra 9,9 nos EUA e 11 na Inglaterra.
O melhor caminho para resolver o problema é por meio da castração, que precisa chegar a 70% para garantir a estabilidade da população canina. Mas nada impede que os coreanos, na medida de suas possibilidades, auxiliem nessa tarefa.


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