São Paulo, segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

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Incidente só foi relatado após tragédia, diz secretário

Nomeado por Serra, José Luiz Portella revela que vai reestudar forma contratual da linha 4 do Metrô firmada na gestão Geraldo Alckmin

Portella diz que só soube de rebaixamento de terreno 20 horas após acidente

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Titular da Secretaria dos Transportes Metropolitanos no governo José Serra (PSDB), pasta responsável pelas obras do Metrô de São Paulo, José Luiz Portella diz que só foi informado às 10h30 de anteontem sobre um incidente ocorrido na quinta-feira passada, quando houve um aumento do rebaixamento do terreno na obra da estação Pinheiros.
Ou seja, quase 20 horas depois do maior acidente da história da companhia estadual. Esse rebaixamento, conhecido como recalque, é comum pelo método de escavação adotado naquele lugar, mas sua aceleração é uma "anormalidade".
O secretário diz que foi avisado do fato pelo gerente de engenharia do Metrô, Ricardo Leite, que informou ter sido avisado do recalque pelo Consórcio Via Amarela só na noite de sexta, também depois do acidente.
Portella diz não ter condições ainda de saber se o incidente lhe deveria ter sido comunicado pelo consórcio com antecedência, mas já revela que vai reestudar a forma de contratação feita pelo governo do Estado na linha 4.
O modelo, que passou a ser adotado e defendido com unhas e dentes pela gestão do também tucano Geraldo Alckmin, é conhecido como "turn key", de preço fechado, que dá mais autonomia à empreiteira para tocar a obra -diferentemente do sistema de preço unitário, no qual cada passo e mudança precisa de aval do poder público, por poder afetar custos. O Consórcio Via Amarela não quis se manifestar ontem. Portella assumiu a pasta neste ano. O presidente do Metrô, Luiz Carlos David, que assinou os contratos da linha 4, está no cargo desde a gestão Alckmin e foi mantido por Serra. Leia abaixo trechos da entrevista do secretário à Folha:

 

FOLHA - O sr. não soube com antecedência do recalque na obra em Pinheiros ocorrido na quinta-feira?
JOSÉ LUIZ PORTELLA
- Eu não sabia, não fui eu que falei [sobre esse tema à imprensa] e aquilo que se sabia é diferente [do publicado ontem pela Folha, de que os revestimentos do túnel estavam cedendo]. Quem sabia era a empresa, que relatou ao Ricardo [Leite, gerente de engenharia do Metrô] depois, que me relatou às 10h30 de sábado. Ele disse que a empresa havia detectado uma aceleração no nível de recalque, rebaixamento do nível do terreno. E que eles, na opinião deles, tomaram as devidas providências.

FOLHA - O consórcio tinha a obrigação de informar vocês antes sobre a aceleração do recalque?
PORTELLA
- Não sei dizer. Na obra acontece uma série de novidades. [Não sei] que tipo de novidade tem que informar e que tipo de novidade não tem que informar. É um contrato "turn key". Como é um contrato fechado, a empresa é responsável por ele como um todo. Ela é que fez os projetos e que toma as decisões porque ela assume a responsabilidade total depois. Vamos supor que fosse um projeto feito pelo Metrô. Qualquer alteração ela teria que avisar. O Metrô teria que dizer se está de acordo, se vai alterar.

FOLHA - O sr. é a favor do "turn key"? Há quem diga que ele permite muita autonomia à empresa e pouca fiscalização dos órgãos públicos.
PORTELLA
- Ou é "turn key" ou é preço unitário. Há prós e contras dos dois lados. O "turn key" tem vantagens e desvantagens, uma delas a autonomia. O unitário também tem vantagens e desvantagens. Muitas vezes facilita a ter aditivos maiores. O cara vai mudando os projetos. Agora quero fazer um estudo de cada um dos modelos e discutir com a diretoria do Metrô.

FOLHA - O sr. se refere às futuras linhas, não para a 4?
PORTELLA
- Para todas.

FOLHA - O sr. não tem idéia do que pode ter ocorrido no acidente?
PORTELLA
- Só dá para saber depois do laudo do IPT.

FOLHA - Mas está confiante em relação aos contratos assinados?
PORTELLA
- Eu vou estar seguro depois do laudo do IPT. Ele é que vai me dar segurança. A posição fácil é ficar contra a empreiteira. Não vou ficar contra nem a favor.

FOLHA - O laudo do IPT pode demorar meses. Até lá não haverá nenhuma medida para garantir a segurança em outros pontos?
PORTELLA
- A segurança tem que ser a mesma: rigorosa.

FOLHA - Houve contestação de parentes de supostas vítimas sobre a demora das autoridades em reconhecer a chance de haver vítimas.
PORTELLA
- Não houve demora. Uma coisa é reconhecer a possibilidade de haver vítimas. A outra é reconhecer vítimas, que é só quando você acha. Não pode haver açodamento. Não pode ficar falando que tem vítima, criando um clima de tensão, se você não tem certeza.

FOLHA - Um repórter da Folha presenciou uma declaração do presidente do Metrô dizendo ao Serra ser possível prever esse acidente...
PORTELLA
- Não vi ele falar. Se alguém prevê problema, evita. Agora, a obra num poço tem nível 4 de risco de acidente. Significa que a probabilidade de risco é maior que nível 3, 2 e 1.

FOLHA - É possível não haver atrasos na linha 4 depois do acidente?
PORTELLA
- É possível a recuperação do prazo. Pode acontecer e não acontecer. Pode ficar mais caro? Não sei. Mas se ficar a empresa vai ter de repor.

FOLHA - O poder público não terá nenhum gasto extra?
PORTELLA
- Não.

FOLHA - Oito acidentes já ocorridos na linha 4 são um índice aceitável?
PORTELLA
- Me informaram que sim. Não tenho informação de nada irregular. Até a hora do acidente ninguém tinha me informado nada sobre nenhuma irregularidade, risco, problema ou alguma coisa na obra, nenhum registro de anomalia.

FOLHA - Mesmo se tiver sido uma fatalidade todos os custos serão do consórcio?
PORTELLA
- Sim, não pode adicionar custo para nós.


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