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Incidente só foi relatado após tragédia, diz secretário
Nomeado por Serra, José Luiz Portella revela que vai reestudar forma
contratual da linha 4 do Metrô firmada na gestão Geraldo Alckmin
Portella diz que só soube de rebaixamento de terreno 20 horas após acidente
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
Titular da Secretaria dos
Transportes Metropolitanos
no governo José Serra (PSDB),
pasta responsável pelas obras
do Metrô de São Paulo, José
Luiz Portella diz que só foi informado às 10h30 de anteontem sobre um incidente ocorrido na quinta-feira passada,
quando houve um aumento do
rebaixamento do terreno na
obra da estação Pinheiros.
Ou seja, quase 20 horas depois do maior acidente da história da companhia estadual.
Esse rebaixamento, conhecido
como recalque, é comum pelo
método de escavação adotado
naquele lugar, mas sua aceleração é uma "anormalidade".
O secretário diz que foi avisado do fato pelo gerente de engenharia do Metrô, Ricardo Leite,
que informou ter sido avisado
do recalque pelo Consórcio Via
Amarela só na noite de sexta,
também depois do acidente.
Portella diz não ter condições ainda de saber se o incidente lhe deveria ter sido comunicado pelo consórcio com
antecedência, mas já revela que
vai reestudar a forma de contratação feita pelo governo do
Estado na linha 4.
O modelo, que passou a ser
adotado e defendido com
unhas e dentes pela gestão do
também tucano Geraldo Alckmin, é conhecido como "turn
key", de preço fechado, que dá
mais autonomia à empreiteira
para tocar a obra -diferentemente do sistema de preço unitário, no qual cada passo e mudança precisa de aval do poder
público, por poder afetar custos. O Consórcio Via Amarela
não quis se manifestar ontem.
Portella assumiu a pasta neste ano. O presidente do Metrô,
Luiz Carlos David, que assinou
os contratos da linha 4, está no
cargo desde a gestão Alckmin e
foi mantido por Serra. Leia
abaixo trechos da entrevista do
secretário à Folha:
FOLHA - O sr. não soube com antecedência do recalque na obra em Pinheiros ocorrido na quinta-feira?
JOSÉ LUIZ PORTELLA - Eu não sabia,
não fui eu que falei [sobre esse
tema à imprensa] e aquilo que
se sabia é diferente [do publicado ontem pela Folha, de que os
revestimentos do túnel estavam cedendo]. Quem sabia era
a empresa, que relatou ao Ricardo [Leite, gerente de engenharia do Metrô] depois, que
me relatou às 10h30 de sábado.
Ele disse que a empresa havia
detectado uma aceleração no
nível de recalque, rebaixamento do nível do terreno. E que
eles, na opinião deles, tomaram
as devidas providências.
FOLHA - O consórcio tinha a obrigação de informar vocês antes sobre a
aceleração do recalque?
PORTELLA - Não sei dizer. Na
obra acontece uma série de novidades. [Não sei] que tipo de
novidade tem que informar e
que tipo de novidade não tem
que informar. É um contrato
"turn key". Como é um contrato fechado, a empresa é responsável por ele como um todo. Ela
é que fez os projetos e que toma
as decisões porque ela assume a
responsabilidade total depois.
Vamos supor que fosse um projeto feito pelo Metrô. Qualquer
alteração ela teria que avisar. O
Metrô teria que dizer se está de
acordo, se vai alterar.
FOLHA - O sr. é a favor do "turn
key"? Há quem diga que ele permite
muita autonomia à empresa e pouca fiscalização dos órgãos públicos.
PORTELLA - Ou é "turn key" ou é
preço unitário. Há prós e contras dos dois lados. O "turn key"
tem vantagens e desvantagens,
uma delas a autonomia. O unitário também tem vantagens e
desvantagens. Muitas vezes facilita a ter aditivos maiores. O
cara vai mudando os projetos.
Agora quero fazer um estudo
de cada um dos modelos e discutir com a diretoria do Metrô.
FOLHA - O sr. se refere às futuras linhas, não para a 4?
PORTELLA - Para todas.
FOLHA - O sr. não tem idéia do que
pode ter ocorrido no acidente?
PORTELLA - Só dá para saber depois do laudo do IPT.
FOLHA - Mas está confiante em relação aos contratos assinados?
PORTELLA - Eu vou estar seguro
depois do laudo do IPT. Ele é
que vai me dar segurança. A posição fácil é ficar contra a empreiteira. Não vou ficar contra
nem a favor.
FOLHA - O laudo do IPT pode demorar meses. Até lá não haverá nenhuma medida para garantir a segurança em outros pontos?
PORTELLA - A segurança tem
que ser a mesma: rigorosa.
FOLHA - Houve contestação de parentes de supostas vítimas sobre a
demora das autoridades em reconhecer a chance de haver vítimas.
PORTELLA - Não houve demora.
Uma coisa é reconhecer a possibilidade de haver vítimas. A
outra é reconhecer vítimas, que
é só quando você acha. Não pode haver açodamento. Não pode ficar falando que tem vítima,
criando um clima de tensão, se
você não tem certeza.
FOLHA - Um repórter da Folha presenciou uma declaração do presidente do Metrô dizendo ao Serra ser
possível prever esse acidente...
PORTELLA - Não vi ele falar. Se
alguém prevê problema, evita.
Agora, a obra num poço tem nível 4 de risco de acidente. Significa que a probabilidade de risco é maior que nível 3, 2 e 1.
FOLHA - É possível não haver atrasos na linha 4 depois do acidente?
PORTELLA - É possível a recuperação do prazo. Pode acontecer
e não acontecer. Pode ficar
mais caro? Não sei. Mas se ficar
a empresa vai ter de repor.
FOLHA - O poder público não terá
nenhum gasto extra?
PORTELLA - Não.
FOLHA - Oito acidentes já ocorridos
na linha 4 são um índice aceitável?
PORTELLA - Me informaram que
sim. Não tenho informação de
nada irregular. Até a hora do
acidente ninguém tinha me informado nada sobre nenhuma
irregularidade, risco, problema
ou alguma coisa na obra, nenhum registro de anomalia.
FOLHA - Mesmo se tiver sido uma
fatalidade todos os custos serão do
consórcio?
PORTELLA - Sim, não pode adicionar custo para nós.
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