São Paulo, segunda-feira, 17 de janeiro de 2005

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CRIMES INVISÍVEIS

Núcleo de Estudos da Violência pretendia analisar, entre outros pontos, eventuais distorções nas estatísticas

Secretaria barrou pesquisa sobre BOs

DA REPORTAGEM LOCAL

Casos de encontro de cadáver e morte a esclarecer eram um dos alvos de uma pesquisa do Núcleo de Estudo da Violência da USP (Universidade de São Paulo). Mas a coleta de dados pelos pesquisadores em distritos policiais de São Paulo está suspensa desde 2003.
Segundo a pesquisadora Wânia Pasinato Izumino, doutora em sociologia, policiais dos distritos informaram que receberam determinação da Secretaria da Segurança Pública de não permitir mais o acesso aos dados de boletins e inquéritos.
Com a supervisão de Sérgio Adorno, coordenador do núcleo, a pesquisa pretendia medir a taxa de impunidade penal. Para isso, seriam acompanhados crimes violentos ocorridos entre 1991 e 1999, dos primeiros registros policiais até as sentenças judicias.
Segundo Wânia Izumino, os registros de encontro de cadáver e morte a esclarecer foram incluídos na pesquisa depois de denúncias de suposta maquiagem de boletins. "Poderia ser um desvio. Por isso, incluímos esses casos."
A coleta de dados em 14 distritos e duas delegacias de defesa da mulher da Seccional Oeste de São Paulo começou em dezembro de 2001, com autorização do então secretário da Segurança Pública, Marco Vinicio Petrelluzzi -Saulo de Castro Abreu Filho assumiu o cargo em janeiro de 2002. A primeira fase incluía a pesquisa dos livros de registros -listagens das ocorrências de inquéritos.
Em junho de 2003, porém, os pesquisadores foram informados pelos policiais que o acesso aos dados havia sido suspenso, segundo a pesquisadora. Ela diz que a secretaria exigia todos os resultados da primeira fase da pesquisa. Essa solicitação significava, na opinião dela, uma tentativa de controle do trabalho científico.
"Isso é uma afronta. Já tínhamos passado a metodologia, os pesquisadores responsáveis e os objetivos. Temos de prestar os dados brutos para a fundação financiadora. Não temos de prestar contas para a secretaria do que é feito com dados públicos", afirma a pesquisadora.
Segundo ela, o NEV encaminhou, em meados de 2004, novo ofício reforçando as informações sobre objeto e metodologia, mas até agora não houve resposta.
A pesquisadora diz que não houve tempo para analisar os casos de morte a esclarecer e encontro de cadáver. Mas foi possível tomar algumas conclusões no trabalho. "O preenchimento [do boletim] não tem padrão nenhum. É feito a partir da cabeça do escrivão", afirma. A proibição do acesso prejudicou a pesquisa, que já deveria estar na fase de conclusão, mas apresenta hoje várias lacunas, segundo Wânia Izumino.
A Secretaria da Segurança Pública afirma que a pesquisa está paralisada porque o NEV não encaminhou informações solicitadas, como metodologia, objetivos e dados sobre a primeira fase. O órgão diz que avisou o núcleo sobre isso, mas não teve retorno. A secretaria diz ainda que tem interesse na realização da pesquisa.
De acordo com o coordenador da CAP, Túlio Kahn, que já foi pesquisador do NEV, o governo estaria abrindo uma exceção se não exigisse as informações dos pesquisadores. Segundo ele, as mesmas exigências são feitas a outras instituições de pesquisa do país e do exterior. (GILMAR PENTEADO E ALEXANDRE HISAYASU)

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