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EDUCAÇÃO
As atuais demandas sociais restringem a chance de êxito do programa Alfabetização Solidária no país
Fim do analfabetismo ainda é promessa
GILBERTO DIMENSTEIN
do Conselho Editorial
Perto de concluir o século, o
Brasil já deveria ter erradicado o
analfabetismo -era o que previa
a Constituição de 1988, numa
promessa para superar o grau
mais agudo de ignorância.
Substituto do desmoralizado
Mobral, lançado nos tempos do
regime militar, o programa Alfabetização Solidária, criado no primeiro mandato do presidente
Fernando Henrique Cardoso, encontrou o país longe daquele ideal
da Constituição, com indicadores
de analfabetismo superiores até
mesmo aos de nações mais pobres da América Latina ou mesmo da Ásia.
Segundo estimativas oficiais,
haveria hoje em torno de 20 milhões analfabetos acima de 14
anos. O fracasso é visível pela lenta queda. Em 1992, eram 17,2% da
população. Em 1995, esteve próximo dos 16%, até chegar aos atuais
14%. No Paraguai, por exemplo, o
índice é de 8%.
Seguindo esse ritmo, apenas daqui a 25 anos o analfabetismo absoluto -daquele que não sabe ler
nem escrever- estaria extirpado
do cenário nacional. Ou seja, mais
de uma geração.
Diferentemente do Mobral, a
marca do Alfabetização Solidária
é a parceria, atraindo a comunidade, sindicatos, empresários e
universidades para o esforço educacional, oferecendo um curso de
cinco meses.
Até dezembro deverá atingir
776,6 mil alunos, atuando em 866
municípios, especialmente no
Norte e no Nordeste, segundo informa a coordenadora do programa, Regina Esteves.
Em vários municípios em que o
programa está sendo aplicado,
como Dona Inês (interior da Paraíba) -um dos campeões de
analfabetismo-, o impacto vai
além de aprender a ler e a escrever. Mães e pais aprendem o valor
da educação e insistem para que
seus filhos permaneçam na escola. A própria coordenação do programa reconhece, porém, que as
limitações hoje ainda são maiores
do que no passado.
As chances de sucesso do programa são mais restritas porque
as demandas sociais são maiores e
exigem melhor qualificação da
mão-de-obra.
Apenas cinco meses de estudo
não garantem, segundo os especialistas, que o aprendizado seja
fixado. Exige-se, no mínimo, mais
quatro anos de escolaridade.
Apenas saber ler e escrever,
mesmo o nome ou um simples bilhete, dava, até anos atrás, chance
de emprego - hoje beira a total
impossibilidade.
Uma das peças fundamentais
do Alfabetização Solidária são os
cursos supletivos, complementares aos cinco meses. A implementação desses cursos depende, porém, da vontade dos municípios.
Muitos deles, segundo os alfabetizadores, têm prefeitos e mesmos
secretários da Educação analfabetos ou semi-analfabetos.
"Vimos prefeitos que precisam
ter assessores apenas para leitura", afirma Regina Esteves.
A gradação do analfabetismo é,
hoje, mais sutil, fazendo dos 20
milhões apenas uma parte - e
não a pior -da ignorância crônica.
Cerca de 50 milhões de brasileiros não têm mais de quatro anos
de estudos; enquadram-se, portanto, na categoria dos analfabetos funcionais.
São incapazes, por exemplo, de
ler e entender um manual, impossibilitados, assim, de trabalhar como operários nas fábricas.
De acordo com os dados do Tribunal Superior Eleitoral, em cada
três eleitores um pode ser classificado de analfabeto funcional.
Mesmo em São Paulo, a cidade
mais rica do país, a situação é péssima. Segundo dados da Fundação Seade, o analfabetismo caiu
para 5,3%; em 1994, era 6,5%.
Quando se leva em conta o chamado analfabetismo funcional, as
estatísticas mostram que em cada
três trabalhadores, um está nessa
categoria -candidato, portanto,
a se marginalizar no mercado de
trabalho. Dados do IBGE indicam
que, entre 1992 e 1996, as vagas
oferecidas para quem tinha menos de cinco anos de escolaridade
caíram 8%. Se incluída a nova categoria dos analfabetos, os tecnológicos -aqueles sem noção básica de informática-, a imensa
maioria dos trabalhadores estaria
enquadrada.
O analfabetismo mostra como
crescem as desigualdades regionais -mais um fator de concentração de renda. Em 1980, o analfabetismo no Nordeste era de
45% da população com mais de 14
anos -2,7 vezes menos do que na
região Sudeste.
Em 1996, apesar dos avanços, o
analfabetismo do Nordeste é 3,3
vezes maior do que o do Sudeste.
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