|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Juiz decide que escola privada pode vetar criança com Down
Ação era movida por mãe de garota, que teve matrícula rejeitada por colégio particular
Juiz diz que obrigação é do
Estado, não da escola;
Procuradoria afirma que
Constituição garante
"igualdade de condições"
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Se na novela das oito Regina
Duarte fica inconformada
quando colégios particulares
não aceitam a matrícula de sua
filha portadora de síndrome de
Down, na vida real, Cristiane
Roncon, 36, sabe bem o que é
ter de lidar com essa frustração.
Além de não conseguir colocar
a filha na escola que gostaria, na
semana passada recebeu o resultado da sentença que moveu
contra o colégio e ficou sabendo que também havia perdido a
batalha na Justiça.
O juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São
Paulo, entendeu que a escola
tem o direito de recusar a matrícula de uma criança deficiente e deu ganho de causa à ré -a
escola-, que afirmou que não
estava preparada para lidar
com alunos com necessidades
especiais. O argumento do juiz
foi o de que é dever do Estado, e
não da rede particular, atender
os estudantes portadores de
deficiência. Procurado pela Folha, ele não quis dar entrevista.
"Tenho o direito de colocar
minha filha em uma escola particular, e não apenas na rede
pública", diz Cristiane. "A
Constituição proíbe qualquer
tipo de discriminação, e não
vou aceitar esse tipo de argumento. Já entramos com um
recurso contra a decisão."
Há dois anos, Cristiane tentou matricular Lívia, 7, na Nova
Escola, na Vila Mascote, zona
sul da capital. "Eles disseram
que seria impossível aceitar minha filha, que não estavam preparados e nem fizeram um dia
de adaptação com ela", conta.
"Encontrei outro colégio no
Morumbi, mas tivemos de mudar de casa e de rotina. A Lívia
está indo superbem na escola
nova, acompanha a turma. Resolvi processá-los por danos
morais porque acho que uma
escola precisa estar apta a lidar
com portadores de Down."
O processo na Justiça correu,
e a audiência aconteceu em junho. "Mas a sentença só saiu
agora, e foi um choque", diz
Cristiane. A decisão de Teodoro causou surpresa até na Procuradoria da República. "Achei
estranho um juiz dar o direito à
escola de recusar matrícula de
alguma criança. Estou analisando a legislação e quero pedir
o deslocamento do processo
para o âmbito federal", afirma a
procuradora da República no
Estado de São Paulo Eugênia
Augusta Fávero.
Ela diz que a Justiça normalmente segue a tendência mundial e opta pela inclusão das
crianças com algum tipo de deficiência em escolas "normais".
Apesar de não ter números, Eugênia lembra que, em pelo menos três casos, escolas foram
consideradas culpadas.
Igualdade
A procuradora afirma, ainda,
que o artigo 206 da Constituição garante que o ensino será
ministrado com base em vários
princípios, entre eles o da
"igualdade de condições para
acesso e permanência na escola". "O juiz está na contramão
do que educadores vêm pregando", diz. "A inclusão está até
na novela." Educadores concordam que crianças com deficiências devem freqüentar escolas "normais", mas dizem
que professores precisam ter
capacitação para isso.
A Nova Escola foi procurada,
mas a secretária disse que diretores estavam incomunicáveis.
Texto Anterior: Debate: Pesquisadores divergem sobre ensino fundamental de 9 anos Próximo Texto: Inclusão de crianças com deficiências na escola beneficia todos, dizem educadores Índice
|