São Paulo, domingo, 18 de agosto de 2002

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EDUCAÇÃO

Segundo especialistas, baixa auto-estima faz estudante desistir de disputa por vaga na universidade gratuita

Aluno da rede pública foge do vestibular

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Os estudantes da rede pública de São Paulo e do Rio desistem de entrar na universidade antes mesmo de tentar o vestibular. O fenômeno, conhecido por educadores estudiosos do assunto como auto-exclusão, se acentuou nos últimos anos, apesar do aumento significativo do número de alunos formados no ensino médio público.
Segundo dados do censo escolar do Ministério da Educação, em São Paulo, 430 mil alunos se formaram na rede pública em 2000. Desses, 51 mil se inscreveram no vestibular da USP. Na Unesp e na Unicamp, a situação é parecida. Em 2000, os inscritos da rede pública no vestibular da Unesp foram 39 mil e na Unicamp, 15 mil.
No caso da USP, isso significa que, na melhor das hipóteses, apenas 11,9% dos alunos que se formam em escolas estaduais, federais e municipais se inscreveram no concurso. A proporção é ainda menor, já que nas estatísticas de inscritos da rede pública na USP estão também alunos que concluíram o ensino médio em anos anteriores ao do exame.
Na rede privada, o número de concluintes em 2000 é quase o mesmo de inscritos no vestibular da USP. Nesse ano, as escolas particulares formaram 90 mil alunos e a universidade teve 87 mil inscritos no exame egressos de instituições privadas.
Para a ex-secretária de Estado da Educação Rose Neubauer, parte do problema é explicada pela falta de auto-estima do aluno. "Há um componente de falta de incentivo e da auto-imagem que se criou da escola pública. A sociedade e a imprensa criam a idéia de perdedor do aluno da rede pública. Ele se vê dessa forma antes de prestar vestibular", diz.
Na avaliação do coordenador do Naeg (Núcleo de Apoio aos Estudos de Graduação) da USP, Adilson Simonis, a tese da auto-exclusão se aplica principalmente em cursos de menor procura, como os da área de humanas. "Em cursos como ciências sociais e licenciatura, o aluno do ensino médio público compete de igual para igual com os demais", afirma.
Nos cursos com maior procura, como medicina e jornalismo, Simonis diz que a tese de que o estudante da rede pública tem menos chance é confirmada pelas estatísticas de aprovação no vestibular da USP. "A necessidade de preparação é muito forte", afirma.
Estudo elaborado pela equipe do Naeg mostra que, apesar de representarem 36% dos inscritos, a proporção de alunos da escola pública entre os aprovados para uma vaga é de apenas 19%. Nas carreiras menos concorridas, o desempenho dos estudantes da rede pública é melhor.
O secretário da Educação do Estado do Rio, William Campos (PT), afirma que o problema também é causado pela própria escola: "A escola pública tem vergonha de preparar para o vestibular. Usou-se por muitos anos o discurso de que ela é feita para formar cidadãos. Mas isso também passa por ter uma formação universitária", diz.
Em São Paulo, o fenômeno da auto-exclusão tem aumentado. De 1995 para 2000, segundo o MEC, houve um aumento expressivo de 77,9% no número de concluintes da rede pública no ensino médio. Foi um aumento superior ao verificado entre os concluintes da rede particular (28,8%).
Apesar do aumento maior nas escolas públicas, principalmente nas estaduais, a proporção de estudantes dessa rede e da privada que tentam uma vaga na maior universidade pública do país não se alterou de 1995 a 2000, permanecendo em 36% de alunos da pública contra 60% da particular (os 4% restantes não se encaixam em nenhuma das definições).
No Rio, as comissões de vestibular da UFRJ e da Uerj não forneceram dados que permitissem a comparação com a evolução do número de concluintes.


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