São Paulo, sábado, 18 de agosto de 2007

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WALTER CENEVIVA

ANAs em turbulência

A Anac acabou simbolizando o lado pior das agências reguladoras, com setores de direção estranhos ao meio

A PARTIR DE MEADOS dos anos 90, a burocracia brasileira passou por uma transformação que assustaria até Max Weber se vivo fosse (1864-1920). Refiro-me às ANAs do título, ou seja, às agências nacionais reguladoras, das quais a Agência Nacional de Águas, de 2000, é exemplo característico.
Destinaram-se a gerir matérias submetidas ao monopólio da União, com a elasticidade marcada por leis sucessivas que compuseram, no último decênio do século 20, a Aneel (da energia elétrica) no final de 96, a Anatel (das telecomunicações) e a ANP (do petróleo), ambas de 97, e a Anvisa, para a vigilância sanitária, em 99. Hoje são 12, além do Dnit (Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte).
O leitor tem todo direito de perguntar o que Max Weber (sociólogo e professor alemão de economia política) tem a ver com tantas siglas brasileiras (inclusive a célebre Anac). Foi Weber quem, sobretudo, em dois volumes, sob o título "Economia e Sociedade", escreveu a respeito dos problemas da burocracia, de sua indispensabilidade, mas também de seus defeitos -entre os quais a complicação tortuosa dos ritos, desde o difícil acesso do público à demora no decidir.
Num Brasil de burocracia lusitana, as agências se destinaram a ultrapassar limites próprios da administração tradicional, estendidos, ao longo dos anos, pelos burocratas, até o congestionamento, que só alguns deles conseguem desvendar. Quando conseguem fazê-lo.
Weber entra nisso também porque, para ele, o funcionalismo de carreira se manifesta pelas competências oficiais, com poderes de mando necessários e bem divididos, capacitados "para o cumprimento regular e contínuo dos deveres assim distribuídos e o exercício dos direitos correspondentes".
Acontece que a burocracia tem, como objetivo precípuo, manter o poder, assegurar influência permanente, afastar estranhos. No Estado Democrático de Direito, com eleições sucessivas, os estranhos surgem sempre, com idéias que lhes parecem novas e geniais (às vezes são). Fazem da placidez burocrática um mar revolto. Atacam de fora da burocracia, sob a alegação (às vezes correta) de que são vítimas do cupim da estagnação.
Assim nasceu a onda das agências reguladoras, com diretores eleitos e não removíveis, salvo em poucas exceções. Livres (em tese) da interferência política. Em tais agências a escala das promoções, com suas áreas de influência e as tomadas de decisão, não é a da burocracia dos quadros normais. Elas exigem, porém, uma contrapartida indispensável, na competência e na probidade dos escolhidos, com experiência na respectiva área de atuação.
Nesse campo, a Anac andou mal no campo da competência, conforme se vê de seu retrospecto, desde meados do ano passado. A Anac acabou simbolizando o lado pior das agências reguladoras, com setores de direção estranhos ao meio, escolhidos no toma-lá-dá-cá da política. Não souberam enfrentar os problemas do segmento ao qual deveriam regular, corrigir, impulsionar. Seu mau exemplo, contudo, não justifica reformulação radical. As ANAs, sem partidarização exagerada, tendem a compor bons mecanismos administrativos, que não dispensam, contudo, opções mais ágeis de verificação técnica de sua qualidade e da capacitação dos dirigentes escolhidos.


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