São Paulo, sábado, 19 de fevereiro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Clínica pública livra quase metade dos jovens das drogas

Dos 223 adolescentes atendidos desde 2009 em Cotia, muitos com 14 e 15 anos, a maioria é viciada em crack

Internação é voluntária e dura 3 meses; modelo é baseado em hospital dos EUA, onde índice de recuperação é de 60%

CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

Aos 8 anos, Cléber (nome fictício) fumou o primeiro cigarro. Aos 10, pulou para a maconha e o álcool. Aos 13, incorporou a cocaína. Aos 15, se afundou no crack. Passou a roubar nas ruas de Amparo (SP) para sustentar o vício.
Há um mês, Cléber, hoje com 17 anos, está internado na primeira clínica pública paulista para dependentes químicos adolescentes, aberta em Cotia (SP) em 2009.
Segundo estudo inédito da instituição, quase a metade (45%) dos 223 garotos atendidos na clínica conseguiu se livrar das drogas (a maioria, crack) em dois anos.
Um outro estudo recente da Universidade Federal de São Paulo, que acompanhou 107 usuários de crack por 12 anos, mostrou que 29% deles estavam abstinentes há ao menos cinco anos.
Do total de meninos atendidos na clínica pública, 96,7% usavam crack e/ou cocaína como drogas de primeira escolha. Em seguida, veio a maconha, consumida por 88% dos garotos.
Mantida pelo Hospital Samaritano e pela Secretaria de Estado da Saúde, a clínica se baseia em um modelo norte-americano, desenvolvido desde 1975 pela Clínica Chestnut, em Illinois (EUA). Lá, os índices de recuperação de adolescentes são de 60%.
As internações são voluntárias e duram três meses. Em geral, os jovens são encaminhados por unidades de saúde. Depois, continuam sendo acompanhados por dois anos em ambulatórios.
No período de internação, cada jovem é avaliado individualmente. Se tiver outros transtornos psiquiátricos (como depressão e impulsividade), recebe remédios e outros tipos de terapia (comportamental, por exemplo).
"Não é sair dando remédio para todo mundo. Mas 58% dos meninos aqui têm problemas associados que precisam ser tratados junto com a questão da dependência", diz o psiquiatra Pedro Katz, diretor técnico da clínica.
Além do acompanhamento psiquiátrico e clínico, também recebem orientações de psicólogos, de nutricionistas e de educadores. Todos os dias, eles têm aulas de português, matemática e música.
"O foco é resgatar a autoestima e a motivação. Isso vai desde arrumar os dentes a ensinar o jovem a ler e a escrever", conta o psiquiatra.
Para a pesquisadora americana Lily Anderson, que presta consultoria para a clínica, a chave do modelo para tratamento da dependência, que funciona tanto aqui como nos EUA, é substituir os sentimentos negativos dos adolescentes pelos positivos. "Se punição funcionasse, não teríamos mais problemas com as drogas."
Existem poucos trabalhos científicos sobre o tratamento de adolescentes dependentes químicos e, em geral, as clínicas usam modelos de adultos em jovens.
O médico diz que, em dois anos, houve um crescimento do número de usuários de crack atendidos e uma diminuição da faixa etária. "Antes tínhamos mais garotos com 17 anos. Agora, temos muitos de 14, 15", afirma.
Para ele, apesar de os governos terem acordado para a "explosão" do consumo de crack e discutido formas de combatê-lo, é preciso tratar a dependência como "síndrome crônica recorrente."


Texto Anterior: Adaptação leva de 3 a 4 dias, afirma médico
Próximo Texto: Necessidade de internação de crianças viciadas não é consenso
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.