São Paulo, terça-feira, 19 de maio de 2009

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CECILIA GIANNETTI

Gotham City é aqui


Na hora do "vamos ver", o que possuímos não é equipamento nem nenhuma equipe de CSI. Temos só defeitos especiais.


INIMIGO NÚMERO 1 da polícia do Rio de Janeiro, Batman, super-anti-herói vinculado aos altos escalões da milícia carioca conhecida como Liga da Justiça, que atua na zona oeste: assim pode ser apresentado o ex-PM Ricardo Teixeira da Cruz (este nome, sua verdadeira e menos glamourosa identidade), que escapou do presídio Bangu 8 pela porta da frente, em outubro passado, sem algemas nem constrangimentos, tendo pago aos nossos homens da lei pelo direito à fuga folgada módicos R$ 2 milhões.
Batman foi capturado na semana passada, finalmente, com requintes cinematográficos, em residência modesta de subúrbio insuspeito:
"Os policiais jogaram um feixe de luz em cima da casa e anunciaram que ele estava cercado", disse aos repórteres o novo chefe da Polícia Civil do Rio, Allan Turnowski.
Nesta situação policial algo americanizada, não cabe um cabo José, um delegado Pedreira ou coisa parecida, conforme os chamariam nossas telenovelas. Não! Temos um Allan Turnowski.
Não me aborrecem os nomes e alcunhas estrangeiros -não quero bancar aqui o Ariano Suassuna genérico e generalizante desta questão que certamente tem ângulos bem mais complexos-, mas especialmente me incomoda o fato de que, na hora do "vamos ver", o que possuímos não é nenhum equipamento nem equipe de CSI. Temos apenas defeitos especiais.
Estamos muito mais para Guarda Belo, do desenho animado; senão um condenado com tantos crimes nas costas jamais teria fugido debaixo da vigilância que deveria ser eficaz e honesta.
Chovo no molhado? Culpe a constância com que a precariedade oficial socorre a criminalidade. Mas temos cá um caso de sucesso, quase uma ficção policial de TV a cabo norte-americana. Regozijai. A título de curiosidade: nos mesmos jornais que noticiavam a prisão de Batman, encontrei um soldado chamado Franklin Delano Roosevelt, do Batalhão de Choque, que fora atingido de raspão na barriga e em cheio no dedo polegar esquerdo. Franklin Delano Roosevelt, como o 32º presidente dos Estados Unidos da América (1933-1945).
Meu filho nerd de 11 anos, caso já o tivesse gerado e parido e o criasse com zelo exagerado de mãe que não lê mais gibis, mas crimes nos jornais, hoje velaria o sono da criança hipotética, eu, dormindo com um olho aberto, temendo que Batman pudesse invadir nossa residência trazendo em seu cinto de utilidades dois fuzis, duas pistolas e quatro granadas, do mesmo jeito que o encontraram quando foi preso naquele esconderijo no subúrbio de Paciência.
Paciência, amigos, futuros pais de filhos que terão de viver nesta cidade, país de poucos, quase nenhum herói e crescente exército de matadores impunes.
E o feixe de luz, que jogaram em Batman, quando a missão criada pelo chefe Allan Turnowski o surpreendeu no tal casebre tão diferente da mansão Wayne... Será que fazia pairar o símbolo do Homem-Morcego ou só a luz da realidade de nossa polícia?
Eu não o acharia estranho, se fosse verdade... temos mesmo no metrô de Copacabana, estação Siqueira Campos, a certa altura do teto, em meio ao trecho de caminhada que nos leva às escadas rolantes, um gracejo de arquiteto que reproduz lá em cima, no arco da estação, o próprio ícone do Batman dos quadrinhos. Nesta Gotham City, cidade-piada, tudo é possível.


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