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LETRAS JURÍDICAS
A guerra que não tem fim
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
A concepção mais comum do terrorismo distingue seus autores de suas vítimas. Quanto a estas, acentua o
estado de medo, angústia ou sofrimento ante a efetivação de danos pessoais por atos de ataque
ou destruição destinados a alterar a ordem vigente e até pela
simples ameaça de alteração. Do
ponto de vista do agente, a tendência geral, inclusive a da mídia, é caracterizar como terroristas grupos que se unem com finalidades políticas e eventualmente
religiosas para ataques contra
pessoas ou bens, públicos ou privados, em destruição indiscriminada e cruel. O ETA, a Al Qaeda e
o IRA são organizações lembráveis, que governos insistem em referir, aumentando o prestígio
delas.
Essa visão é incompleta, pois exclui o terrorismo do Estado, menos perceptível porque desenvolvido em segredo ou porque anunciado como parte de ações nacionais dentro e fora de seu território, coberto pela força da propaganda. A diferença entre os dois
tipos surgiu clara durante a semana na ampliação da distância
entre a Europa (que quer o respeito às liberdade públicas e ao Direito) e os Estados Unidos (que
negam eficiência à atitude conciliatória), que defendem a
militarização do combate antiterrorista.
O terrorismo do Estado une forças policiais, militares ou de
agências de inteligência, matando, provocando acidentes, assaltando cidadãos ou pessoas, para
derrubar governos, dominar espaços ou mesmo gerar o medo pelo próprio medo. Uma parte da
doutrina Bush afirma o direito
unilateral de medidas preventivas com o uso da força contra
ameaças de ataques de onde quer
que surjam. O presidente da Comissão Européia, Romano Prodi,
sintetizou a posição contrária: "O
uso da força não é a solução".
Em termos de Direito, a ação
unilateral de qualquer país para
ingressar em território estrangeiro é reprovada pela Carta da
ONU e por tratados internacionais. Foi o que aconteceu no Iraque, na invasão por motivo falso.
Quando a Carta é ofendida, tratados e convenções são substituídos pela força e pela agressão.
Formas mais graves são as que
não observam a prévia autorização do Conselho de Segurança ou
desrespeitam as normas que este
venha a editar. Para manter a dominação, instala-se uma espécie
de terrorismo oficial que não respeita o Estado de Direito, gerando
mais mortes e violência de todos
os lados.
A legítima defesa é, porém, assegurada pela Carta da ONU no caso de ataque armado contra
membro das Nações Unidas. A
comunicação de ações projetadas
para essa finalidade ao Conselho
de Segurança é obrigatória. Por
isso a deliberação espanhola de
retirar suas tropas se a ONU não
assumir o controle iraquiano respeita o direito internacional.
Governos e organizações terroristas se acusam mutuamente,
atribuindo a culpa dos ataques a
atos do outro lado. À medida que
os confrontos se tornam mais violentos, a possibilidade de composição dos contrários diminui.
Agrava o horror do terrorismo
que mata inocentes. É uma forma
nova de guerra para a qual Von
Clausewitz, o maior estudioso dos
conflitos armados, não achou solução adequada, a não ser a do
entendimento. Napoleão Bonaparte, que entendia de guerras,
disse bem: quem construir um
trono de baionetas não se sentará
nele. Violência atrai violência.
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