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BANHO DE LOJA
Bairro do centro de SP prepara-se para virar grande pólo de moda
Bom Retiro contra-ataca
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um pedaço do Bom Retiro sofreu um choque de design. Os comerciantes do bairro que produz
um terço da roupa brasileira, segundo estimativa dos lojistas, perceberam que para vender moda
que pareça de ponta precisam ter
lojas com arquitetura fashion.
Esse ovo de Colombo desencadeou um movimento de revitalização do bairro na região central
de São Paulo, impulsionado por
uma nova geração de empresários coreanos. As repercussões
dessa nova onda vão desde o aumento da exportação à renovação
urbana, da abertura de bares à hotelaria. Há boas novas em pelo
menos cinco frentes:
O governo do Estado decidiu
criar uma Escola Superior de Moda num prédio de 1893 que abrigou o Desinfectório Central, instituição que combatia epidemias;
Começa a funcionar em maio
um hotel quatro estrelas, num
prédio de 16 andares, em frente ao
parque da Luz. O Luz Plaza consumiu R$ 6 milhões e foi bancado
integralmente por três empresários de origem coreana;
Cerca de 200 lojas foram reformadas. Os espaços atulhados
de roupas foram substituídos por
lojas com pé direito duplo, com
cerca de cinco metros de altura, e
vitrines que exibem até motos
Harley Davidson de R$ 50 mil;
Quem faz compra na região
vai ganhar calçadas mais largas,
padronizadas e bancos para descansar. A fiação será subterrânea
e os postes vão desaparecer. As
obras serão lançadas no dia 5;
O mais ambicioso dos projetos, arquitetado pela Secretaria de
Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento do Estado e por uma organização não-governamental chamada Associação Projeto Bom
Retiro, visa incluir a indústria da
moda do bairro na globalização.
A capacidade de investimento
dos comerciantes surpreendeu
até a prefeitura: "Foi uma das melhores surpresas que tivemos", diz
Marcos Barreto, 35, que coordena
o programa de revitalização do
centro da Emurb.
Muito além do urbanismo
Pode parecer delírio uma secretaria e uma ONG tentarem reposicionar um setor industrial ao
mesmo tempo em que tentam recuperar um bairro, mas o arquiteto Cleiton Honório de Paula, 32,
diretor do Projeto Bom Retiro, diz
que a abrangência é proposital.
"Se você não for ambicioso em
São Paulo, não faz nada. A maioria dos projetos urbanísticos fracassa porque não se articulam
com o comércio, com a história e
com a vocação da região."
O economista Julio Cesar Orfati
Jr., 37, dono da SalSweet Beach
Wear, que vende um biquíni decorado com 5.300 pérolas por 570
libras na Inglaterra, diz que o que
está em jogo é a sobrevivência do
bairro: "Só reformar calçada não
resolve. Estamos mudando porque se vier a Alca (Área de Livre
Comércio das Américas), o Bom
Retiro pode sumir do mapa".
Moda é a vocação do Bom Retiro desde os anos 20, quando os
imigrantes judeus chegaram. Dominaram o comércio até o final
dos anos 70, quando seus filhos
deram as costas para o comércio e
a área entrou em decadência. Vieram os coreanos, mas só agora
eles começam a deixar as suas
marcas. Uma das mais impressionantes é uma igreja católica para
1.500 pessoas num bairro famoso
por suas 12 sinagogas.
O Bom Retiro foi escolhido para
sediar um projeto de modernização do governo do Estado porque
moda é um setor estratégico, segundo o secretário João Carlos
Meirelles, 69: "O mundo fashion é
uma das melhores oportunidades
para exportar e gerar empregos".
Meirelles cita um estudo do
BNDES, segundo o qual o setor
têxtil é o que mais gera empregos.
De cada R$ 1 milhão investido,
são criados 197 empregos.
"Escolhemos o Bom Retiro porque eles não estão pedindo dinheiro. Querem tecnologia. Os
coreanos têm uma objetividade
impressionante", relata o secretário. O IPT (Instituto de Pesquisas
Tecnológicas) prestará assessoria
para um grupo de 30 empresas.
Made in Bom Retiro
O governo corre atrás de um fato esboçado -o Bom Retiro já
exporta para os EUA, México,
Chile, Inglaterra e França. "Conseguimos exportar porque a qualidade atingiu um padrão internacional", diz Won Suk Chang, 38.
O que obrigou o bairro e a moda
ali produzida a mudar foi a globalização, segundo Chang: "A globalização puxou a qualidade para
o alto. Hoje eu exporto para a
França. Produzo as blusas que são
vendidas no Club Med", diz.
A Rosa Chá, a mais conhecida
das grifes do bairro, é talvez o melhor exemplo de como o mercado
externo ajudou a tirar o bairro da
decadência. Há oito anos, segundo o estilista Amir Slama, 39, ele
exportava 0,3%; hoje, envia para
fora 23% da moda praia que faz.
"A moda brasileira faz tanto barulho lá fora que criou espaço para uma segunda linha, que é a que
movimenta a economia. É o Bom
Retiro que está fazendo essa linha
mais barata", afirma Slama.
A evidência, ele conheceu numa
viagem a Miami: "São umas marcas de jeans "made in Brazil" que
eu nunca vi no Brasil".
A mudança já pode ser vista nas
ruas: são compradores americanos, chilenos ou mexicanos.
É esse público mais sofisticado
que Reginaldo Olivi, 43, diretor
do grupo hoteleiro Chambertin,
busca para o hotel quatro estrelas
que administrará no parque da
Luz. Segundo ele, passam pela região do Bom Retiro 70 mil pessoas
por dia e já há uma elite que busca
acomodação melhor.
A grande questão que paira no
ar, segundo ele, é segurança. "A
Luz e o Bom Retiro têm tudo para
virar o Soho por causa da Pinacoteca, da Sala São Paulo e do pólo
de moda", diz, referindo-se à região de Nova York. "Mas, se não
removerem a cracolândia, o paulistano não vem para cá."
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