São Paulo, terça-feira, 21 de outubro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

entrevista

Expor receptor é antiético, afirma médico

DA REPORTAGEM LOCAL

O coordenador da Central Estadual de Transplantes, Luiz Augusto Pereira, diz que não se deve divulgar o nome das pessoas que receberam ou vão receber os órgãos da estudante Eloá Cristina Pimentel. O contato entre a família do doador e a do receptor, de acordo com ele, pode criar um envolvimento sentimental perigoso. "É uma questão de ética. As conseqüências são imprevisíveis. A mãe acha que uma parte do filho que morreu está ali naquela pessoa", diz o coordenador. Das quatro pessoas que já receberam órgãos de Eloá, só uma teve o nome divulgado. Os parentes da paciente fizeram questão disso, como forma de agradecimento à família da adolescente de Santo André. Os parentes dos outros três pacientes preferiram o anonimato. A seguir, trechos da entrevista do coordenador da Central de Transplantes.
(RW)

 

FOLHA - O que o sr. pensa da exposição de pessoas que passaram por transplante?
LUIZ AUGUSTO PEREIRA
- Somos totalmente contra colocar a família do doador do órgão em contato com a do receptor. É uma questão de ética. As conseqüências são imprevisíveis. A mãe acha que uma parte do filho que morreu está ali naquela pessoa. Você nunca sabe que tipo de envolvimento sentimental vai surgir ali. Eu dou aula e sempre conto aos alunos uma história extrema, que ocorreu nos Estados Unidos. Um paciente que havia recebido um coração foi atrás da família do doador. Ele acabou se casando com a viúva dele e depois se suicidou, da mesma maneira que o doador. Houve ainda o caso do receptor de um coração que depois ficou sabendo que o coração era de uma mulher. Por causa disso, ele nunca mais quis voltar para a cidade natal dele. Outra possibilidade é a família com problemas financeiros pedir dinheiro: "Já que você está vivo à custa do órgão do meu filho, você poderia ajudar um pouco".

FOLHA - A Central de Transplantes não divulga os nomes?
PEREIRA
- Da Central de Transplantes não sai o nome do paciente nem o da instituição [hospital]. Mas vocês [os meios de comunicação] acabam descobrindo. Ficam de plantão no local da retirada e vão atrás do carro [que leva os órgãos].

FOLHA - Não se deve divulgar o nome mesmo que as famílias do doador e do receptor queiram?
PEREIRA
- Nem nesse caso. Num primeiro momento, tudo pode ficar bem. E depois? Não acompanhamos esses casos.

FOLHA - O fato de a doação dos órgãos de Eloá ter sido bastante divulgada é algo positivo, não é?
PEREIRA
- É positivo, porque ajuda a sociedade a ver que o diagnóstico de morte encefálica é feito com muito rigor. É algo que demora. Isso dá segurança para a família. E também mostrou que a distribuição de órgãos é feita pelo governo, com critérios transparentes, e não por equipe [de hospital].


Texto Anterior: Quatro pessoas recebem órgãos transplantados de Eloá
Próximo Texto: Velório de Eloá atrai 11,8 mil pessoas, tem fila e tumulto
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.