São Paulo, quinta-feira, 21 de outubro de 2010

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Brasileira acusada de fazer sexo é absolvida

Jovem de 15 anos fora condenada nos Emirados Árabes a 6 meses de prisão

Corte de apelação anulou sentença inicial; a adolescente tinha sido julgada como adulta com base na lei islâmica

Fotos Marcelo Ninio/Folhapress
Tribunal de Abu Dhabi, país onde a brasileira de 15 anos havia sido condenada a prisão por manter relações sexuais

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A ABU DHABI

A Justiça de Abu Dhabi (Emirados Árabes) absolveu ontem a brasileira de 15 anos que havia sido condenada à prisão por manter com um paquistanês relações sexuais extraconjugais, prática vetada pelas leis do islã.
Uma corte de apelação decidiu anular a sentença que condenou a jovem a seis meses de prisão, seguida de deportação. Na prática, aceitou o argumento da defesa de que a garota não deveria ter sido julgada como adulta.
A Promotoria ainda poderá recorrer da decisão na Suprema Corte do país, mas a possibilidade é considerada remota tanto pelos advogados da menina quanto pela Embaixada do Brasil.
"Há interesse de todos os lados de colocar um ponto final nessa história", disse o diplomata Arthur Nogueira, que acompanhou o caso. "A menina e a mãe estão extremamente felizes e aliviadas."
Procurada seguidamente pela Folha, a mãe da adolescente preferiu não falar.
O veredicto praticamente encerra o drama vivido nas últimas semanas pela adolescente carioca, que vive em Abu Dhabi com a mãe brasileira e o padrasto alemão.
Um caso que pulou das páginas dos jornais locais para a imprensa internacional no último dia 10 de agosto, quando um tribunal condenou a menina com base na sharia (lei islâmica).

INTERPRETAÇÃO RÍGIDA
Mesmo para os padrões locais, a raríssima condenação de uma menor por "relações ilícitas" com base na sharia provocou choque.
A brasileira fora julgada como adulta devido a uma interpretação rígida da sharia, que considera a primeira menstruação como prova de maturidade legal.
Com o apoio da Promotoria, que também viu exagero na condenação, a defesa recorreu do veredicto e o caso foi para uma corte de apelação, que ontem anulou a sentença da brasileira.
O veredicto do paquistanês, que continua preso, ainda não foi anunciado. Ele foi condenado inicialmente a um ano de prisão, seguido de expulsão do país.
Na corte de apelação, ambos os réus mudaram suas versões iniciais, afirmando que jamais tiveram relações sexuais. A defesa ainda alegou que a confissão da menina foi obtida sob pressão.
Na audiência que precedeu o veredicto de ontem, o paquistanês, um motorista, chegou com pés e mãos algemados. A brasileira, que apesar da condenação ficara em liberdade após o pagamento de fiança, ficou frente a frente com ele, mas ambos evitaram trocar olhares.

SAIA LONGA
Vestida com uma saia longa, jeito e corpo de menina, a menor parecia assustada.
Das poucas alunas negras de uma cara e elitista escola internacional em Abu Dhabi, virou centro das atenções da mídia local e motivo de constrangimento para a família.
Por ironia, o caso só foi parar na Justiça por iniciativa da família, que denunciou o motorista depois que a menina o acusou de estupro.
O drama veio à tona após a adolescente ter sido vista em seu quarto com o paquistanês pela empregada da família, uma imigrante do Sri Lanka.
"Ela [a empregada] testemunha que no dia do crime, em 31 abril de 2010, os pais estavam fora de casa, no emirado de Dubai. Ela foi bater na porta do quarto da ré para chamá-la para jantar. Mas a menina proibiu a testemunha de entrar no quarto", descreve o processo.
"Ela saiu do quarto e fechou a porta atrás dela em estado de perturbação. A testemunha percebeu que algo estava errado e ficou observando o quarto por 45 minutos, até ver o réu saindo. Na hora, ligou para a mãe da ré e contou o que acontecera."

CERVEJA E SEXO CASUAL
O processo narra em detalhes um enredo de sedução e sexo casual, incluindo o momento em que a menina leva uma lata de cerveja para o paquistanês, o que adicionou ao processo o crime de ingestão de bebida alcoólica, prática também proibida pela lei islâmica.
Para May Al Dabbagh, diretora do Programa de Gênero da Dubai School of Government, a discriminação de mulheres é uma realidade inegável nas cortes dos Emirados Árabes.
"Se a aplicação da sharia fosse justa, não teríamos dois veredictos diferentes sobre o mesmo caso", afirma.


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