São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2004

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Salvador legitima sabedoria popular

DA AGÊNCIA FOLHA, EM SALVADOR

A cena é muito comum no Candeal, bairro localizado no centro de Salvador. Antes de procurarem os médicos, os dentistas, os enfermeiros e os agentes comunitários que trabalham no único posto de saúde do local, os moradores costumam comparecer à casa de Maria José Menezes dos Santos, 63, que há mais de quatro décadas "receita" e produz medicamentos fitoterápicos -à base de plantas- para os seus "pacientes".
"Os meus remédios curam a tosse, a bronquite, a asma, a anemia, a rouquidão, o colesterol prejudicial à saúde e qualquer tipo de dor", diz Santos, que não concluiu a quarta série do ensino fundamental. "Todos os meus oito filhos e os quatro netos foram criados com remédios naturais."
De fato, a tradição do bairro levou a Prefeitura de Salvador a inaugurar, no final de 2003, o primeiro posto de saúde do município voltado à fitoterapia. Uma horta, com 39 espécies de plantas medicinais, cerca a unidade. Outras 40 mudas devem ser plantadas nos próximos dois meses.
"A sabedoria popular jamais pode ser desprezada. Verbalmente, costumo receitar ervas para os meus pacientes", disse a médica Lícia Regina Peixinho, 45, que trabalha no posto de saúde.
Antes da inauguração do posto, médicos da prefeitura e funcionários do departamento do curso de farmácia da FTC (Faculdade de Tecnologia e Ciências) identificaram e cadastraram 92 espécies de plantas medicinais utilizadas pelos moradores do bairro. "Nós apenas legitimamos a sabedoria popular", disse a secretária municipal da Saúde, Aldely Rocha, 53.
Segundo a dentista Tânia Carvalho, 47, que também trabalha no posto, "os remédios à base de folhas não têm contra-indicação". Mesmo em seu consultório, fora do posto, a dentista costuma receitar um chá de malva aos pacientes que necessitam de um medicamento antiinflamatório.
"Rezadeira" do bairro, Marinalva Ventura de Almeida, 45, disse também tomar medicamentos à base de folhas. "Algumas plantas têm eficácia comprovada há mais de um século." De acordo com a secretária Aldely Rocha, o primeiro posto a aceitar a fitoterapia em Salvador promoveu uma "inclusão" social em Candeal. "Antes da inauguração, os moradores já consumiam as ervas. Nós não temos o direito de mudar uma crença. Afinal, qual o brasileiro que não foi criado tomando chá?"


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