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Não há museu 100% seguro, diz Júlio Neves
Presidente do Masp afirma não estar "fugindo da responsabilidade" e ter o "maior interesse" em deixar o cargo em 2008
Segundo ele, após o furto, a segurança do museu, feita por homens com rádios
e sem "alarme de fazer barulho", será revista
TEREZA NOVAES
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente do Masp, Júlio
Neves, afirmou ontem que a
instituição "não está fugindo da
responsabilidade" e que agora
faz "uma agenda positiva" para
recuperar as obras e repensar a
segurança do prédio.
"Não existe no mundo nenhum sistema que tenha 100%
de garantia", afirmou.
À frente da instituição desde
1994, o arquiteto de 75 anos
disse ter dormido apenas duas
horas desde que soube do furto.
Leia a seguir os principais
trechos da entrevista, concedida depois que Neves esteve
com o governador José Serra e
o ministro da Cultura, Gilberto
Gil, durante assinatura de convênio entre o Estado e a União.
FOLHA - Qual foi sua reação ao receber a notícia?
JÚLIO NEVES - Evidentemente
foi uma surpresa. Em 60 anos
nada semelhante [tinha acontecido] e aquilo que tínhamos
como sistema de segurança
funcionou, até em tentativas
recentes [de assalto].
Não existe no mundo nenhum sistema que tenha 100%
de garantia. Tem com mais ou
menos riscos. Funcionamos na
avenida Paulista durante 30
anos sem qualquer equipamento de segurança. Ela sempre foi
feita com nosso pessoal. Até
que fizemos uma grande reforma, em 2001. Colocamos o melhor sistema de segurança que
havia, mas é claro que, em
2007, há coisas mais modernas.
FOLHA - Houve uma tentativa de
assalto na segunda passada?
NEVES - Não, houve um princípio, uma coisa muito empírica.
FOLHA - Como um princípio?
NEVES - O sujeito chegou perto
da porta e, com o barulho, o segurança olhou por cima e fugiram. Não chegaram a entrar.
FOLHA - O museu tem alarme?
NEVES - O alarme que nós temos é pelo radinho, não é o
alarme de fazer barulho. Era o
sistema que existia quando a
gente fez a reforma. É visual. A
segurança do museu prefere fazer ronda com o pessoal e através de rádio. Agora, nós vamos
rever todos os sistemas.
FOLHA - Em setembro, o sr. afirmou à Folha que não poderia informar o valor do seguro das obras...
NEVES - Das obras, dentro do
museu, nunca teve. Nenhum
museu do Brasil tem e se algum
no mundo tiver, eu não conheço. As obras são seguradas
quando saem da porta do museu. Cada vez que sai está no seguro. Quando recebemos uma
obra, do Louvre ou do MoMA,
também está no seguro. A questão do seguro é assim.
FOLHA - Algumas pessoas levantaram a hipótese de seqüestro.
NEVES - Sinceramente, seria leviandade dizer que pode ter sido ou não. Provavelmente, a
formulação dessa hipótese é
decorrente do fato que essas
obras que, embora sejam insubstituíveis, são invendáveis.
O mundo inteiro já foi notificado, com fotos dos quadros.
FOLHA - O museu pagaria resgate?
NEVES - Não temos dinheiro.
Estamos estudando até a possibilidade de uma pessoa que está se oferecendo a dar gratificação para as obras voltarem ao
museu. Mas jamais faríamos algo contra a lei. Há duas possibilidades: pode ter sido ação de
uma quadrilha altamente sofisticada e também pode ser uma
coisa de amadores.
FOLHA - A reserva técnica é considerada tão segura quanto um cofre.
Por que as obras em exposição não
têm o mesmo tratamento?
NEVES - O prédio é uma obra
tombada. Os grandes museus
do mundo fizeram suas ampliações, também pelo fato de serem edifícios tombados, no
subterrâneo. No subsolo, eu
pude fazer fechado, de concreto. No segundo andar, não posso mexer no projeto.
FOLHA - Mas a porta horizontal na
escada é fechada só com cadeados...
NEVES - Sempre foi assim. Há
40 anos que era a mesma coisa.
É claro que depois de acontecer
uma coisa dessa, vamos rever
tudo. Foi uma enorme surpresa
e um grande aborrecimento.
Nós não queremos culpar ninguém. Não adianta dizer: "O governo não fez isso ou não ajudou". Não estamos fugindo da
responsabilidade.
Estamos tentando fazer uma
agenda positiva. Tomamos todas as providências para que isso [as telas] não saia do país e
para que seja encontrado. Em
seguida, vamos ver o que pode
ser melhorado.
FOLHA - O sr. acredita em envolvimento de funcionários?
NEVES - Seria uma leviandade
minha dizer que tem e seria
pretensão, que não tem. Quem
tem que descobrir é a polícia.
FOLHA - Como é feita a seleção dos
seguranças do museu?
NEVES - Eles não chegam a 50.
Tem processo de triagem. É a
mesma coisa que contratar
qualquer funcionário: ficha, experiência, currículo. Há um
procedimento normal do RH.
FOLHA - E o fato de os funcionários
não terem formação em segurança?
NEVES - Não sei se eles têm ou
não têm. Eles têm experiência
daquele trabalho que fazem
porque são ensinados. Até que
provem o contrário, são merecedores da nossa confiança e
competentes para o trabalho.
Pode ser que lá no meio tenha alguma pessoa [que esteja
envolvida]... Isso tudo pode
acontecer, mas não estou dizendo que aconteceu.
FOLHA - Há quanto tempo esses
seguranças estão no museu?
NEVES - Não sei.
FOLHA - Eles são contratados como
orientadores de público?
NEVES - São contratados como
orientadores de público, no
sentido que podem responder
perguntas. Eles não estão lá só
para ficar de segurança, sem falar com ninguém, como um
guarda do palácio da Inglaterra.
FOLHA - Mas qual é função principal deles?
NEVES - A função deles é fiscalizar tudo aquilo que está acontecendo no andar. São seguranças também...
FOLHA - A função deles então...
NEVES - A função é clara: tomar
conta da segurança.
FOLHA - Por que eles são contratados como orientadores?
NEVES - As coisas do museu são
feitas assim há 20 ou 30 anos,
entende? Sempre foi. É um nome. Se alguém se aproxima do
quadro ou pega um cigarro, ele
tem que orientar o público, dizer: "O sr. não pode passar dessa linha, não pode fumar aqui".
FOLHA - O que será feito na segurança em um primeiro momento?
NEVES - Não sei. Instalamos essa comissão para fazer todas as
recomendações.
FOLHA - O sr. pretende sair no ano
que vem do museu?
NEVES - Tenho maior interesse
em sair da presidência, mas não
pretendo deixar de colaborar.
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