São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 2008

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GILBERTO DIMENSTEIN

Máquina do sonho

Ao acordar, suspeitou que a idéia de vender CDs numa máquina talvez não fosse uma maluquice onírica

LANÇADA NESTE MÊS, uma máquina de venda de CDs com baixo custo para dar mais dinheiro ao músico e combater a pirataria nasceu de um sonho -literalmente.
Autor de composições cantadas por Ivete Sangalo, Lenine e Daniela Mercury, o violonista e percussionista Fefê Gurman finalizava, no ano passado, gravações de suas próprias músicas, mas o meio de distribuir o CD o angustiava. "Sonhei que meus CDs estavam dentro de uma dessas máquinas automáticas de vender salgadinhos e refrigerantes."
Ao acordar, suspeitou que talvez a idéia não fosse uma maluquice onírica e contou o sonho a alguns de seus colegas da Eletrocooperativa, uma entidade que dá cursos gratuitos de produção musical para jovens -o programa nasceu em Salvador, mas agora tem um núcleo em São Paulo. "Ninguém achou que a máquina fosse inviável."

 

Paulistano, Fefê passou sete anos em Salvador. Apesar de ter emplacado uma série de músicas com cantores de sucesso, ele voltou para a cidade convencido de que não conseguiria viver apenas como artista e, para sobreviver, além de começar a dar aulas, abriu uma pizzaria. "É aqui que as coisas, de fato, acontecem", justifica Fefê, ao explicar por que abandonou a paisagem do mar.
Não imaginava que "acontecer" nas artes significaria, para ele, ser dono de pizzaria e, mais estranho ainda, desenvolver equipamentos tecnológicos.
Um dos integrantes da Eletrocooperativa, Daniel Turcheto, dedicou-se a estudar o funcionamento das máquinas que vendem salgadinhos com a intenção de adaptá-las para o comércio de CDs. "Bastavam algumas mudanças", apostou Turcheto.
A engenharia mais complexa seria a comunitária: estabelecer um preço que proporcionasse aos artistas a possibilidade de ganhar mais, sem passar pelo intermediário, mas que fosse, ao mesmo tempo, suficientemente atrativo para combater o apelo do baixo custo da pirataria.
 

O CD sai por R$ 5, devidamente explicados na fachada da máquina: custo de fabricação (R$ 1,50), valor do imposto (R$ 0,50) e pagamento do artista (R$ 1,50) são alguns dos itens. "O artista ganha 30% mais do que ganharia numa gravadora", afirma Turcheto, inspirado na filosofia do comércio justo.
A máquina atraiu músicos como Arnaldo Antunes e teve seu primeiro teste há duas semanas num show ao ar livre. Foram vendidos 200 CDs em dois dias.
O trabalho agora é, de um lado, arregimentar mais grupos dispostos a vender suas músicas pelo sistema criado pela Eletrocooperativa e, de outro, espalhar as máquinas pelas cidades. Para facilitar essa disseminação, não patentearam a invenção.
"Em cinco minutos de conversa, desistimos de patentear. Queremos que as pessoas possam nos copiar", orgulha-se Fefê.
Essa é a única "pirataria" da qual se sentem beneficiados.
 

O sonho agora (desta vez acordado) é que eles consigam fechar um acordo com o Metrô e colocar uma máquina em cada estação.

gdimen@uol.com.br

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