|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LETRAS JURÍDICAS
Há sinais do terremoto
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Juízes gaúchos, em pronunciamento público, estão
a dizer que o Supremo Tribunal
Federal (STF), hoje presidido pelo
gaúcho Nelson Jobim, é submisso
ao Executivo. A secção paulista
da OAB, em documento preparado por cinco de suas comissões, fez
avaliação crítica da advocacia,
mas também assinalou pontos
nos quais vê sérias deficiências do
Judiciário: falta de aparelhamento, congestionamento provocado
principalmente pelo poder público (sem resistência da magistratura), aumento das custas, o que
impede o acesso à Justiça, bem como espírito clerical e hermético,
fugindo da transparência. A exceção detectada pela OAB está no
Superior Tribunal de Justiça. Neste, o presidente Edson Vidigal está atento à funcionalidade e à eficácia, além de manter abertos os
canais de comunicação com a
sociedade.
A OAB vê problemas mais sérios
em São Paulo, a contar do não-controle da produtividade dos
juízes, com punições raras. Diz a
entidade dos advogados ser "cada
vez maior o número de juízes embevecidos com o poder, que se tornam autoritários, quase déspotas,
tratando mal as partes e advogados sob a tolerância das corregedorias e superiores". São palavras
do texto: arbitrariedades comuns;
clientelismo dentro do Judiciário,
trazendo nódoas à necessária independência do magistrado de
instância inferior; o poder público
como principal responsável pela
repetição de causas -freqüentemente, porém, são os advogados
os acusados de sobrecarregar o
Judiciário com supostos recursos
protelatórios.
Exemplo gritante da parceria
entre o Judiciário e o Executivo é
apontado pela OAB-SP quando
refere o descumprimento de ordens judiciais de pagamento, os
célebres precatórios com os quais
o poder público passa o calote nos
seus credores, ao mesmo tempo
em que cobra agressivamente
seus devedores, mostrando que,
nessas alternativas, há grave falta
de ética. A entidade também critica o Supremo Tribunal Federal
por ter adotado a tese de que esse
fato, por si só, não importa em
descumprimento de ordem
judicial.
Conclui a OAB: no mundo real,
onde vivem os seres humanos,
instalou-se o calote institucional.
Informa dados do Estado de São
Paulo: US$ 2 bilhões em precatórios alimentares não-pagos e US$
4 bilhões parcelados para pagamento em dez anos, mas, ainda
assim, descumprido. A OAB federal ingressou com ação declaratória de inconstitucionalidade contra o novo parcelamento, pois o
anterior, em oito anos, sob a desculpa de resolver dificuldades financeiras do poder público, só
aumentou o endividamento. A
última tentativa de diagnóstico
dessa situação foi feita quando
era presidente do STF o ministro
Marco Aurélio.
Até o momento em que este comentário é escrito, nenhuma reação foi lida ou ouvida a respeito
das críticas dos juízes gaúchos e
dos advogados paulistas. Essas
reações sugerem, aos poucos,
aqueles ruídos vindos do fundo
da terra antes do terremoto.
Transparecem, embora com discrição, posições diversas entre os
Tribunais de Alçada de São Paulo
e os rumos adotados pelo Tribunal de Justiça, antes e depois da
greve dos servidores. Se for verdade, como diziam os antigos, que
pelo dedo mínimo se conhece o gigante, talvez se possa dizer que a
ameaça do terremoto está mais
próxima de acontecer. É o momento apropriado para, com
mais força, enfrentar a realidade,
pois a preservação do prestígio
efetivo do Judiciário é fundamental para o direito e para a paz
social.
Texto Anterior: GP Brasil atrai prostitutas à cidade Próximo Texto: Livros jurídicos Índice
|