São Paulo, terça-feira, 23 de outubro de 2007

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análise

Política de confronto não é novidade

MARCELO BERABA
DA SUCURSAL DO RIO

Em 8 de maio de 1995, a polícia do Rio invadiu a favela Nova Brasília, no complexo do Alemão, zona norte, e matou 14 pessoas. Ao menos uma não era bandido. Entre os mortos, três foram atingidos por atiradores em dois helicópteros da polícia. Foram apreendidos 1 kg de pasta de coca, 5 kg de cocaína, 2 kg de maconha e 15 armas.
O então governador Marcello Alencar (PSDB) definiu a ação como um marco de endurecimento do seu governo na repressão ao crime. O delegado que comandou a invasão, Mário Azevedo, disse que "pode ter havido excesso", mas que "numa operação como essa, não se pode exigir uma conduta britânica dos policiais". E concluiu, de acordo com o relato da Folha: "É a única maneira de combater a criminalidade".
A maioria dos corpos tinha perfurações no tórax e cabeça, e dois estavam com as mãos amarradas. Não foi feita perícia no local das mortes antes da remoção para o IML.
A tática de enfrentamento com mortes de bandidos, policiais e moradores não é, portanto, nova na história recente do Rio. Desde a primeira administração Brizola (1983-86) que os governadores que o sucederam adotaram o discurso do confronto (entenda-se invasão de favelas com risco para os moradores) para contrastar com o que foi considerada uma política leniente, porque defendia o respeito aos direitos dos favelados (entenda-se proibir a invasão de casas sem mandados judiciais).
Passados 12 anos da invasão da Nova Brasília, episódio escolhido ao acaso, as operações no Alemão, em 27 de junho, e, agora, na favela Coréia (zona oeste) mostram que praticamente não houve mudança na filosofia de trabalho da Secretaria de Segurança, apesar dos discursos de todos os secretários enfatizarem o contrário.
Como a Folha informou, nos dois confrontos deste ano, tal como em 1995, a maioria dos mortos levou tiros na cabeça, no tórax ou na barriga. Nos três casos não houve preservação do local nem perícia antes da retirada dos corpos.
Em entrevista ontem, o secretário José Mariano Beltrame negou que a política seja de enfrentamento. "É a política da inteligência policial." Mas as explicações que deu para justificar as mortes, inclusive de policiais e moradores inocentes, é simplista: "Os problemas acontecem na execução dessas operações. (...) O problema é a resposta e a maneira como a polícia é recebida nesses locais onde ela vai cumprir sua função".
O trabalho de inteligência é feito exatamente para garantir o maior número de prisões e apreensões de armas e drogas com o menor número de vítimas nos três lados. Embora possa ter apoio em parte da população, não se comprovou até agora a eficácia da política de confronto. O Alemão estava dominado pelo tráfico em 1995 e continua dominado em 2007.


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