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São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2003

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LEI SECA

Falta de estrutura dificulta a aplicação plena da lei municipal que impõe horário para fechamento dos estabelecimentos

São Paulo tem 100 mil bares e 25 fiscais

DA REPORTAGEM LOCAL

Um fiscal para cada 4.000 bares trabalhando oito dias por mês. Os números explicam a dificuldade da Prefeitura de São Paulo em implantar a "lei seca". Apesar de ter criado a lei que impõe horários de funcionamento a bares em 1999, São Paulo ainda esbarra na falta de estrutura para fiscalização.
O Psiu (Programa de Silêncio Urbano), órgão da prefeitura responsável pela verificação da lei, realiza blitze semanais, às sextas-feiras e sábados. Como não possui equipes para vistoriar todos os bairros, faz uma seleção pelo número de reclamações de vizinhos, caso da Vila Madalena (zona oeste), ou pelo índice de violência, como São Miguel Paulista (zona leste).
Acompanhados de agentes da Guarda Civil Metropolitana e da Polícia Militar, os 25 fiscais do Psiu têm de vigiar cerca de 100 mil bares. Pela lei, só podem funcionar depois da 1h estabelecimentos que tenham isolamento acústico, segurança e estacionamento.
"Infelizmente, na periferia fiscalizamos apenas as grandes avenidas com alta concentração de estabelecimentos", afirma o coordenador do Psiu, Rosano Maieto. Ele explica que o Psiu escolhe as vias com maior índice de homicídios, segundo dados da Polícia Militar.
Por esse índice, os pontos mais visitados pelo Psiu são a avenida Marechal Tito, em Itaquera, a rua Itajuíbe, no Itaim Paulista, a avenida do Imperador, em São Miguel Paulista, e a avenida Cupecê, em Cidade Ademar. "Um estudo da PM mostra que, nessas ruas, a maioria dos crimes foi planejada dentro do bar ou aconteceu próximo a ele", diz Maieto.
Porém, com o pequeno número de fiscais, a fiscalização não chega ao interior dos bairros. "Eu nem sabia que essa lei existia. Aqui está cheio de bares que funcionam 24 horas, muitos como locais para tráfico de drogas", diz Sérgio Luiz Ferreira, coordenador da Unidade Comunitária do Jardim Ângela, um dos bairros com maior concentração de bares e botecos.
Uma pesquisa feita há quatro anos pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) com a Unidade Comunitária mostrou que, no Jardim Ângela, existe um bar para cada dez casas. "Não fizemos uma nova pesquisa, mas convivendo na região a gente observa que o número de bares aumentou", afirma Ferreira.
O coordenador do Psiu reconhece o problema e aponta a descentralização como solução para a vistoria. Maieto explica que existe um projeto para criar equipes do Psiu nas subprefeituras.
A dificuldade de implementação plena da lei impede uma comparação entre os índices de violência e o fechamento de bares. Segundo dados da Secretaria Estadual de Segurança, de 1999 a 2002, o número de homicídios na capital caiu 3,73%. Porém, no mesmo período, as tentativas de homicídio subiram 4,41%.
"A lei de São Paulo tem falhas. Não tivemos uma experiência plena para saber se a medida resolve ou não", diz o coronel Rubens Casado, comandante do policiamento na capital.
O secretário municipal de Segurança de São Paulo, Benedito Domingos Mariano, critica o horário estabelecido pela lei. "Um estudo realizado na década de 90 mostrou que a maior parte dos crimes ocorre entre 22h e 0h", diz.
Um dos autores da pesquisa, o cientista social Guaracy Mingardi, 48, concorda com o secretário. Mingardi usa uma alegoria. Diz que o homem, ao beber, passa por três fases: a do macaco, alegre, a do leão, valente, e a do porco, quando começa a passar mal.
"O problema é que, no bar, cada um começa a beber num horário. No mesmo lugar convivem os três estágios da bebedeira. Aí o macaco pula na cabeça do leão, que fica bravo e mata o macaco." (ALESSANDRO SILVA E SIMONE IWASSO)

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