São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

foco

Nem Mitsubishi se salva em leilão de automóveis apreendidos de traficantes

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Mitsubishi Eclipse 1995 vermelho-bombeiro engana. Na verdade, não passa de uma vedete decaída entre os 57 carros muito depenados que pertenceram a traficantes e que serão leiloados amanhã pelo Estado de São Paulo.
Tem Belina, Brasília, Chevette, Monza, boa parte irreconhecível e em cores tão atraentes como verde abacate, amarelo ovo e azul anil.
A maioria dos automóveis (com o perdão do trocadilho) é uma droga. No adesivo colado no vidro da caminhonete Saveiro 1994 lê-se: "Necessário Vos É Nascer de Novo".
Os carros são velhos porque só vão a leilão aqueles cujos donos não podem mais apelar judicialmente sua posse. O novo proprietário, por sua vez, não precisa temer o constrangimento de ter de explicar a um guarda que aquele veículo não é de um traficante. O carro está no nome do Estado, e a transferência é feita diretamente para o arrematador.
O leilão é o primeiro do gênero no Estado: a idéia foi da comissão antidrogas da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania de São Paulo, que espera arrecadar R$ 200 mil. Diz que vai usar o dinheiro em campanhas de prevenção ao tráfico e ao uso de drogas.
Do total arrecadado, 60% vão ficar no Estado, os outros 40% seguem para a União, que, de acordo com a lei, também deve aplicar sua parte em projetos de prevenção.
O presidente da comissão, Guilherme Bueno Camargo, diz que quer promover pelo menos três leilões desses por ano, a partir de 2008.
"Se estabelecermos uma rotina, certamente vamos conseguir ter veículos menos velhos, já que é preciso vender primeiro os que estão há mais tempo apreendidos", diz.
E o que era feito dos veículos antes? Bueno diz que ficavam no pátio da polícia.
A empresa responsável pelo evento é a Sodré Santoro, que tem convênio com a secretaria e ficará com 5% do valor de cada venda.
Marco Aurélio Lopes, o encarregado da empresa que mostra o pátio de 300 mil m2 à reportagem, diz que se vendem ali cerca de 500 veículos por dia. "Tem carro que custa R$ 50 mil lá fora e que, aqui, sai por R$ 37 mil", afirma ele, em uma das duas salas destinadas aos leilões. Com ladrilhos brancos e equipada com cadeiras de plástico idem, a sala faz lembrar um templo evangélico.
Apesar das boas oportunidades oferecidas pelo leilão, o próprio Lopes aconselha a deixar a euforia em casa. "Parece um negócio inigualável, mas, na afobação, o cara se afunda", avisa.
Confessadamente "afobado", o comerciante Paulo Freitas conta que arrematou um lote de TV, filmadora e CD player por R$ 900. (Ali se leiloa todo tipo de maquinário). "Aquilo não valia R$ 300. Estava tudo queimado." Parêntese: não é permitido testar a máquina ou investigar o estado de motor, câmbio ou suspensão antes da compra.
Olhando uma Brasília cor de manteiga com as rodas tortas, cheia de buracos de ferrugem e até galhos de árvore no interior, imagina-se que, de graça, aquele carro é caro (já que será preciso rebocá-lo). Mas Lopes afirma que tem quem arremate o que sobrou do veículo por, digamos, R$ 300 e aproveite as peças em carros não tão velhos ou as venda para desmanches.
O leilão não tem lance mínimo: parte do zero. O Eclipse foi avaliado em R$ 12 mil, mas isso não é nem sequer revelado aos participantes. Os organizadores fazem segredo do valor apenas para que os participantes imaginem preços maiores e se "afundem" em lances cada vez mais altos, diz Lopes. Os organizadores garantem que ninguém, "mesmo", sabe do valor de avaliação antes do leilão. Só a Folha.


SERVIÇO - O leilão será amanhã, às 10h, no Pátio Sodré Santoro (Marginal Dutra, km 224, Guarulhos, Grande São Paulo)


Texto Anterior: Última casa de Jorge Amado está abandonada
Próximo Texto: Juiz manda prender nove policiais acusados de roubo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.